Conexão Mansur: No mundo das quatros linhas - Jornal Fato
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Conexão Mansur: No mundo das quatros linhas

Trovas de Raymundo Estevão Pereira


- Ilustração: Zé Ricardo

(Raymundo Estevão Pereira, escritor cachoeirense mais conhecido como Nordestino Filho, membro da Academia Cachoeirense de Letras, entre os anos de 1957 e 1971 lançou diversos livros, boa parte deles de poesia.

Hoje vão, aqui, 18 de suas trovas, que selecionei de seu livro "No Mundo das Quatro Linhas", publicado em 1971, impresso na então tipografia do Ateneu Cachoeirense. O livro, devidamente autografado por Nordestino Filho e com dedicatória ao Professor Florisbelo Neves, ganhei-o do filho deste, meu amigo Sérgio Neves.

E eu, triste por verificar que nossos bons autores vão se perdendo na poeira do tempo, ficaria muito alegre se um cachoeirense poeta e/ou ator apresentasse na Lei Rubem Braga um projeto de leitura de autores antigos cachoeirenses nas Praças da cidade).

Fala Nordestino.

 

Muita coisa que eu não via

E em moço queria ver,

Hoje, velho, todo o dia,

Estou vendo sem querer.

 

A glória de um trovador

Está nos sonhos que sonha

E não em trovas compor

Sobre falta de vergonha...

 

Dentre tudo o que é tristeza

A mais triste que existisse,

Não seria, com certeza,

Mais triste que a da velhice!

 

Desperta o homem certo dia,

De longa noite indormida

E só então, quem diria!

Vê que pouco vale a vida.

 

O dia hoje está chuvoso,

Lá fora tristeza e calma,

Mas eu me sinto ditoso

Porque há sol na minha alma.

 

Olhando o passar das águas,

Olhando as águas que correm,

Eu penso nas minhas mágoas

Que nunca passam... nem morrem...

 

Tu roubaste o meu amor,

Não passas, pois, de uma ladra,

Mas não vou me contrapor

A quem, roubando, me agrada.

 

Muita gente fala, grita

E clama por liberdade,

Mas no meio em que se agita

Dela abusa de verdade...

 

Neste mundo conturbado,

Tenhamos cuidado ingente:

Antes perdoar-se um culpado

Que condenar um inocente.

 

Trato bem todo o mundo,

Trato até cachorro bem;

Porque, pois, certos cachorros

Não tratam-me assim, também?

 

Vive o mundo em guerra e festa,

Enquanto o tempo se escoa...

Dizem que a vida não presta,

Mas eu acho a vida boa!

 

Não ligues para o sorrir

Daquele velho enxerido:

Toda a culpa, hás de convir,

Cabe ao teu mini-vestido...

 

A esperança, eu te asseguro,

Um fruto verde parece:

Queremos vê-lo maduro,

Porém nunca amadurece.

 

Quanta gente, quanta gente

Anda a procura de um galho

De salário convincente

- onde não haja trabalho!

 

O mar... as ondas... a areia...

Muito morena elegante,

Mulher bonita... sereia...

Mas também quanto "elefante"!

 

O Dia de Cachoeiro

Todo afeto e vibração,

É o dia da amizade,

O dia do coração...

 

Guardo no meu coração

Aureolando a minha lira,

Um pouco de inspiração

E a imagem do Itabira!

 

Deus que vive a me seguir,

Dá-me e inspira tanta fé

Que, se algum dia eu cair,

Cairei sempre de pé!

 

Voltando à Impressora do Correio do Sul

Em 20 de agosto de 2019, mais de quatro anos passados, como vereador fiz discurso na Câmara Municipal, sobre a impressora do Correio do Sul, que publico abaixo, com pequenas alterações não modificativas. (Quatro anos passados e a cidade não disse nada, até hoje). Mas vamos ao discurso, melhor dizendo, à Impressora:

- "Falo da Impressora do Correio do Sul - Poucos sabem existir, semienterrada em São Vicente, distrito de Cachoeiro, há mais de 20 anos, a impressora tipográfica (com mais de 120 anos de idade) que imprimiu os jornais "O Cachoeirano" e, depois, o "Correio do Sul".

Em "O Cachoeirano" brilhou Bernardo Horta de Araújo. No "Correio do Sul", brilharam Newton e Rubem Braga, que publicaram nele seus primeiros escritos. E tantos outros brilharam em ambos os jornais... e impressora.

Não sei quantas cidades podem anunciar tão belas histórias. E também não sei quantas cidades podem tratar tão mal sua história.

A impressora foi retirada da antiga sede do jornal Correio do Sul, à Rua Joaquim Vieira, pelo abnegado e "ex-idealista" das causas culturais, Paulo Henrique Thiengo, com a ajuda de um único amigo, a duras penas, trabalho hercúleo, totalmente na mão, sem ajuda de máquina ou de qualquer outra pessoa. ("ex-idealista" é com se refere a si mesmo o Thiengo - coloco assim em respeito a ele, mas não concordo - ele continua idealista).

Breve voltarei ao assunto, com maiores informações. Enquanto isso, espero que alguém que se preocupe com a História de Cachoeiro se anime a sentar com Paulo Thiengo e comigo, para ver se conseguimos montar a impressora em local digno, em nossa cidade. Se não Thiengo vai procurar outra cidade, outro estado, outro país, outro mundo, outra galáxia, onde algum cidadão relativamente abonado, que se preocupe com nossa História e com a História de Newton e de Rubem Braga, finalmente desperte desse sono insano e kafkiano.

 

O Contador de Orelhas

Quando fui funcionário do INPS (era setembro de 1967 - hoje é INSS), trabalhava na Rua 25 de março, no edifício Rage Miguel, onde termina a Praça Jerônimo Monteiro. De vez em quando ia ao Sindicato dos Ferroviários, que era onde ficava a sede do Instituto.

Naquele tempo, quem nos recebia no portão principal do Sindicato (INPS), que dava para uma pequena escadaria, era um segurado, sempre de roupa branca, cuja única função, sei lá o porquê, era fazer a contagem e recontagem de quantas orelhas penetravam na agência.

Trabalho simples, pois não era preciso separar orelhas brancas, negras ou amarelas e nem era necessário fazer distinção entre orelhas coladas ao corpo e orelhas de abano.

Certo que tinha um complicador: como cada pessoa possui duas orelhas (embora falte cérebros a alguns), o cidadão, que fazia as vezes de apontador, era obrigado a fazer dois registros - ambos por extenso. O da primeira orelha: - cento e nove mil trezentos e dezessete orelhas. O da segunda orelha - cento e nove mil trezentos e dezoito orelhas.

Não sei o que levou o dito cidadão a exercer com tanta eficiência o digno e não remunerado mister de contar as orelhas entrantes. Também não sei de alguém que houvesse reclamado sobre algum erro dele, mínimo que fosse. Erro que viesse prejudicar a enormidade de segurados que, já naquele tempo, contribuíam para a previdência social oficial.

O certo que sei é que naquele tempo, em que o homem ficava postado na entrada do INPS controlando a quantidade de orelhas, é que a previdência funcionava muito bem, obrigado. Depois que ele saiu é que a coisa começou a desandar.

Não sei se uma coisa (a saída do contador de orelhas) tem a ver com outra coisa (a falência da previdência social do governo). Se tiver, é só providenciar a volta do homem que contava as orelhas para o seu lugar: à porta do INSS. Se não tiver nenhuma relação, paciência.

(Crônica verdadeira que escrevi e publiquei a bem mais de duas décadas, aqui com adaptações aos novos tempos). Apenas em agosto de 2023, este ano, 56 anos passados do acontecido, vim a saber o nome do Contador de Orelhas, informado pelo amigo Sebastião Jorge Azeredo, que também viveu aquele tempo no INPS - o nome dele é Sr. Agostinho).

 

Voltando ao Censo

Veio recentemente o resultado do censo do IBGE (o último, de 2022), divulgado em junho último, diminuindo a população de Cachoeiro, e eu ainda não estou convencido de ele ser fiel à realidade dos fatos, por três motivos:

Primeiro motivo: - oficialmente quase 3 mil casas do município deixaram de ser recenseadas; isso pode ser de 9 a 12 mil cidadãos não recenseados.

Segundo motivo: - Cachoeiro perdeu, por lei municipal inconstitucional (mas ganhou na Justiça, por ação do Ministério Público), 400 hectares de terra, que haviam passado também inconstitucionalmente para Vargem Alta, no início da década passada... algo próximo a 100 alqueires.  Essa área foi recenseada como? Como Cachoeiro, ou como Vargem Alta? Qual a quantidade de habitantes nessa área?

Terceiro motivo: - Em consequência da determinação da Justiça, de voltar a Cachoeiro os 400 hectares de terra, o mesmo se dará quanto a transferência de terras para Atílio Vivacqua, com a mesma inconstitucionalidade. Essa área foi recenseada como? Como de Cachoeiro, ou como de Atílio Vivacqua? Com certeza que, inconstitucionalmente, como de Atílio Vivacqua, o que não subsistirá na Justiça.

Esses fatores e motivos que deveriam ser verificados pelo poder público municipal de Cachoeiro, nunca ouvi dizer que estivessem sendo.

Mas eles podem sim transformar a queda da população de Cachoeiro, em relação ao censo anterior, para aumento populacional de Cachoeiro, no censo de 2022.


Higner Mansur Advogado, guardião da cultura cachoeirense e, atamente, vereador

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