Ana na Delegacia - Jornal Fato
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Ana na Delegacia


Capítulo 28

 

- Alô? Beto? Beto aqui é a Ana. Não! Por favor, não desliga! Não, não liguei de outro número para te enganar e te obrigar a me atender. Estou ligando da delegacia. O que? Eu procuro confusão? Não me venha com essa! É a confusão que me procura. Para falar a verdade, ando bem tranquila. Já nem penso tanto em você, sabia? É que quando eu fui trabalhar hoje cedo dei de cara com um vestido tão deslumbrante que precisava dele para ontem, sabe? Foi amor mesmo. Entrei, vesti e ficou perfeito. Poxa, Beto! Fazia tanto tempo que eu não me achava bonita! Comprei o vestido caro e lindo com a decisão de sair à noite e me divertir. Vestido caro e lindo trancado na bagunça do meu armário é dinheiro jogado fora. Fiz até unha e cabelo. Calcei meu Louboutin e tinha certeza que a imagem refletida no espelho era de uma mulher arrasadora. Calma, Beto! Acaba de ouvir que ainda não cheguei na parte principal. Reuni umas poucas amigas que me restaram depois do caos instalado a partir de sua entrada na minha vida e fomos animadíssimas e sem rumo curtir por aí. A primeira parada foi em um restaurante japonês bárbaro! Você precisa conhecer. Aliás, precisa conhecer comigo. Quero te levar lá! Depois de muitos saquês e sushis fomos dançar. Como tem gente linda nessa cidade! Não sei se eu estava cega ou se esse povo chegou aqui agora. Dançamos, flertamos e bebemos. Não, não acabei de falar ainda. Não era por nada disso que eu te ligaria de madrugada. Tá pensando que sou louca? Estou contando tudo para chegar ao ponto crucial com tudo muito bem explicadinho. Sabe que sou dessas, não é? Então. Sentamos em uma mesa afastada da pista de dança por causa do barulho. Um cara se aproximou e perguntou se podia sentar com a gente. Eu disse que não, e ele puxou a cadeira ainda assim. Ignorei quando ele disse que ia chamar uns amigos para sentar ali também. Ignorei os amigos que chegaram. Ignorei o fato de serem todos grandes imbecis. Mas quando levantei e um deles segurou no meu braço pedindo para dançar comigo, ficou difícil ignorar. Pedi para me soltar, ele insistiu na dança. Cuspi na cara dele, e ele cuspiu de volta. Ah! Nesse ponto ele despertou aquela Ana que você já conhece. Joguei minha bebida nos olhos dele e, enquanto ele tentava limpar, foi minha oportunidade de cair em cima. Soquei, chutei, arranhei, quebrei cadeira. Fiquei cega de raiva. Minhas amigas e os amigos dele nem se moveram, acredita? Só fomos separados pelos seguranças. Ele foi direto para o hospital. E eu aqui, na delegacia.

 

Os policiais não foram rudes comigo. Deixaram-me aqui sentadinha no cantinho, me deram água, ofereceram café. Agora estão dizendo que meu tempo no telefone tá acabando. Então deixa eu falar logo. Preciso que você venha pagar minha fiança. Não, não tem outra pessoa que faria isso por mim. Por favor, não me deixe aqui nesse lugar. Você não seria capaz. Além disso, é só um empréstimo. Pensa em tudo que já vivemos bem direitinho e avalie. Eu mereço! Sei que mereço. Você tá vindo? Ai que ótimo! Sabia que podia contar com você. Só para terminar: lembra que o vestido que estou usando é novo? Pois é. Se quiser, pode rasgar. Estou morrendo de saudade.

 


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