Véspera de Natal (*) - Jornal Fato
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Véspera de Natal (*)

É público e notório que nosso corpo e nossa mente precisam dar uma relaxada de vez em quando


- Foto Reprodução Web

Todo mundo que exerce alguma atividade profissional, seja com o muque, seja com a cabeça, tem direito a momentos de descontração. Isso não está escrito em nenhum manual do trabalhador, mas é público e notório que nosso corpo e nossa mente precisam dar uma relaxada de vez em quando. Seria ótimo se nosso Criador tivesse acrescentado, em nosso corpo, um dispositivo com as funções "liga/desliga". Sempre que a gente estivesse muito tenso, usaria o "desliga"; voltou ao normal, pronto, "liga". Esse minúsculo interruptor poderia ficar debaixo do braço, no meio das pernas, atrás da orelha... Ou em qualquer outro lugar bem escondidinho.

Cada ser humano recarrega a bateria de suas energias de modo diferente. Um técnico em computação, amigo meu, quando sente que sua cabeça quer entrar em curto circuito, o que ele faz? Pega uma varinha de anzol e vai pra beira do rio pescar piaba. Dez, quinze minutos depois, já se recompõe. Um outro, engenheiro civil, nessas horas de estresse, faz diferente: liga a televisão e vai ver desenho animado. E tudo fica mais fácil após alguns minutos de descontração. Conheço um advogado que se livra do cansaço mental fazendo longas caminhadas. Nesse momento, ele se esquece das audiências, dos processos, dos recursos... Volta outro. Tem gente que se equilibra, emocional ou fisicamente, conforme o caso, jogando bisca, participando de torneio de bola de pau, passeando de bicicleta, cavalgando, jogando pelada...

Tio Dedé, por exemplo, quando percebe, nas suas lidas no meio rural, que está com os nervos à flor da pele, ele vai fazer gaiola. Já dispõe de uma pequena oficina pra esse fim, com furadeira, torno, martelo, lixadeira, alicate, prensa, além dos apetrechos necessários à sua atividade relaxante: madeira, bambu, cola, verniz... E fica, ali, horas e horas, até ver o resultado de sua arte. Prefere ficar só. Quando alguém aparece por lá, ele para de trabalhar, fecha a oficina e vai pra casa. Por quê? Ele próprio explica: "As visitas enchem a paciência da gente com as perguntas mais imbecis: "pra que serve isso...", "pra que serve aquilo...". E começam a dar palpites num assunto que não entendem. Então, melhor parar".

Com a atenção toda voltada para os últimos retoques numa gaiola de curió, Tio Dedé toma um susto com um "dá licença?" Era a esposa de um vizinho que o procurava num lugar impróprio e num momento mais impróprio ainda. "Se é assunto de cozinha, é com minha mulher que a senhora deve falar. Se o assunto é comigo, por favor, diga logo o que deseja, porque eu não posso perder tempo. E outra coisa: fico muito aborrecido quando alguém interrompe meu trabalho aqui."

E a vizinha foi breve: "Hoje é véspera de Natal. Eu só vim aqui pra desejar ao senhor e a toda a sua família muita paz, muita saúde e a proteção do Menino Jesus".

Depois dessa lição, acho que Tio Dedé vai ser mais tolerante com seu próximo.

 

(* Do livro "Peripécias do Tio Dedé")


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