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Rede social é um barato!


Rede social é um barato! Facilita a comunicação: quem não é adepto a respostas, fica à vontade para só ouvir ou ler, inclusive, pode abreviar expressões sem medo de errar; quem é dado às palavras pode falar "pelos cotovelos" sem constrangimento. O interlocutor lê - vê - e responde apenas o que lhe interessa, logo, a mudez não é causa de críticas, o que difere de um diálogo natural, daquele tipo "cara a cara". Se não bastasse, quando não se está para conversa, pode-se tão somente enviar uma carinha ou um sinal e tudo bem, o diálogo se consolidou.

Como tudo na vida, rede social também tem suas intempéries, especialmente quando, por exemplo, pessoas saem compartilhando mensagens sem as passar pelo crivo do bom senso. Isso porque, não raro, são partilhadas mensagens mentirosas (fake news), ofensivas ou as duas juntas, o que é mais grave.

Esses dias, reaprendi sobre a necessidade de se filtrar os objetos de compartilhamento. Isso porque, em um grupo, muito especial, do qual participo, foi encaminhada uma mensagem preconceituosa que criticava, de modo a falsear a realidade, a postura de pastores evangélicos sob argumento de que, em síntese, davam esperança de salvação a presos, muitos destes conhecidos pela repercussão e gravidade de sua conduta delituosa.

No contexto da mensagem, que tomou gancho no final da novela "A Dona do Pedaço", que não assisti, havia uma crítica aos pastores porque alguns presos passaram a andar como a bíblia debaixo do braço, fazendo crer de modo subliminar que segurar a bíblia é mais vergonhoso que os crimes motivadores das prisões.

Se não bastasse, o comunicado trazia em si que as "saidinhas", àquelas dos dias dos pais, das mães, etc., com finalidade de reintegração social, são um benefício aos presos "convertidos". Para isso, afirmava genericamente que os evangélicos têm riqueza, influência e poder nas esferas públicas, o que garante privilégios aos seus adeptos.

Ao ler, fiquei estarrecida, confesso, pois, independentemente da crença, da religião ou da indiferença, a mensagem era carregada de um poder destruidor, enganador e de persuasão que, se compartilhada ao seu bel-prazer, geraria ignorância no leitor e preconceito em face dos evangélicos que, sem ignorar as exceções, nada fazem além de seguir e de cumprir o que ensina a bíblia. Livro esse que, no Brasil, segundo o Censo de 2010, divulgado pelo IBGE, é sagrado - ou deveria ser - para 86,8% da população, percentual de brasileiros que, na época, se auto identificou como cristão.

Apesar de ser um grupo com participantes religiosos, sem perceber, foi compartilhada uma mensagem contra a bíblia, considerada, por muitos, sagrada. E mais, não foi pensado que o conteúdo repassado ofendia o artigo 5º, incisos VI e VII da Constituição Federal, pois estes, respectivamente, garantem inviolabilidade da liberdade de consciência e de crença e assegura a prestação de assistência religiosa nas entidades civis e militares de internação coletiva.

Além disso, a ideia divulgada amargava outro erro, pois a "saidinha" da penitenciária não se trata de um privilégio, mas de um direito de QUALQUER preso que preencha algumas condições, tais quais: estar em regime semiaberto, ter bom comportamento, ter cumprido 1/6 da pena, se o condenado for primário, e ¼ se reincidente (artigos 122 e seguintes da LEP - Lei de Execução Penal).

Se o povo brasileiro concorda ou não com a saída temporária de alguns presos - ou de todos - esse problema deve ser analisado/discutido nas eleições, pois as leis são criadas pelo legislativo que nós, enquanto povo, elegemos. Ser evangélico, católico ou ateu em nada muda o que a legislação criminal e processual pátria traz como pena ou como direito.

Assim, senti o ímpeto de chamar a atenção para o fato de que, seja qual for a forma de comunicação, direta ou à distância, necessário pensar, refletir e filtrar nossas palavras e compartilhamentos de modo que as mensagens sejam verdadeiras, leves, respeitáveis e aptas a edificar o interlocutor, não o agredir ou enganar.

 


Katiuscia Marins Colunista/Jornal Fato Advogada e professora

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