Conexão Mansur: Personagens de Nossa Terra - Jornal Fato
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Conexão Mansur: Personagens de Nossa Terra

Segue a publicação de pequenas bibliografias de pessoas que marcaram a história cachoeirense


- Ilustração: Zé Ricardo

Continuo republicando as pequenas biografias cachoeirenses que intitulei "Personagens de Nossa Terra", publicadas a partir de maio de 2006, a pedido de Joacyr Pinto, na 7 DIAS. Já publicadas, nesta Conexão Mansur, 06 delas, aqui vão mais três, as de números 07 a 09.

 

07 - JERÔNIMO MONTEIRO

Houve época em que Cachoeiro dominou política e administração pública no Espirito Santo. Tempos de Jerônimo Monteiro, governador de 23/05/1908 a 23/05/1912. Líder estadual por 20 anos, advogado, comerciante, deputado estadual e federal e senador, Jerônimo de Souza Monteiro nasceu em 04/06/1870, na Fazenda Monte Líbano, Cachoeiro. 6 irmãos e 5 irmãs, filhos do capitão Francisco de Souza Monteiro e de Henriqueta Rios de Souza. O casal veio de Minas Gerais (Catas Altas e Paulo Moreira), por volta de 1854. Jerônimo estudou no famoso Colégio Caraça (MG) e formou-se pela Faculdade de Direito de São Paulo (1895).

Dizem que seu governo endividou o Estado, o que deve ser verdade; quase todos os governantes endividam o Estado (alguns não endividam e não fazem nada e nada deixam para o futuro. Não é o caso de nosso biografado). Poucos como ele, quase nenhum. Jerônimo revolucionou a arte de governar e trouxe ao Estado (principalmente Cachoeiro e Vitória) melhoramentos de grande governante, de alguém com muita criatividade e visão de futuro.

Nome da praça central da cidade, é o correto reconhecimento dos cachoeirenses a Jerônimo Monteiro. Irmão de Bernardino Monteiro (governador 1916/1920) e do bispo Fernando Monteiro. Cunhado de Florentino Avidos, também governador (1924/1928).

Entre suas realizações principais estão a energia elétrica e o saneamento da capital, a criação da Biblioteca Estadual, do Arquivo Público e da Escola de Belas Artes, a reforma do ensino público estadual e a industrialização de Cachoeiro e de Itapemirim. A Usina Paineiras foi construída em sua administração. Igualmente a Fábrica de Tecidos e a de Óleos, a Fábrica de Cimento (hoje Itabira) e a de Papel (hoje Liceu Muniz Freire).

Caso típico sobre quem se pode dizer que o espaço de que se dispõe é insuficiente para registrar as importantes realizações.

Criou o dístico da bandeira: "Trabalha e Confia", resumo de "trabalha, como se tudo dependesse de ti; confia, como se tudo dependesse de Deus". Morreu pobre em 23/10/1933, dia da diplomação como deputado federal (3º mandato). Saindo do governo, 1812, mandou avaliar o que tinha recebido de presente no período (a moda de presentear é antiga): Um conto e setecentos e quarenta e três mil réis. Doou o valor à Igreja, para que ela cuidasse dos meninos pobres.

 

08 - BASÍLIO CARVALHO DAEMON

Basílio Carvalho Daemon nasceu no Rio de Janeiro em 08/02/1834 e morreu, como bibliotecário, em Vitória, em 01.12.1893. Veio para Cachoeiro provavelmente em 1861, tendo passado por Muqui. Eleito deputado, mudou-se para Vitória em 1872. Com João Paulo Ferreira Rios, fundou o primeiro jornal de Cachoeiro, o semanário "O Itabira". O primeiro número circulou em 04/07/1866. Durou pouco mais de ano. Segundo Levy Rocha, "quando "O Itabira" apareceu, tinha pretensão de pugnar pelas ideias do liberalismo e progresso e fugir dos artigos anônimos, das críticas às vidas privadas, da política e de vinganças. Mas, pugnando pelo partido Conservador, tornou-se virulento, sendo obrigado a suspender a circulação. Manteve vivas polêmicas e debates com a "Sentinela do Sul", primeiro jornal lançado na Vila de Itapemirim, em 24/08/1867". Em 05/04/1868 Daemon voltou à carga, publicando o jornal "Estandarte".

Como boa parte dos antigos de proeminência, exerceu múltiplas atividades: lavrador, seleiro, dentista, comerciante, fazendeiro, professor, advogado (rábula), topógrafo, jornalista, político e orador abolicionista. Presidente da Câmara de Cachoeiro, quando o cargo equivalia ao de Prefeito. Deputado, apresentou projeto para construção da primeira Estrada de Ferro do Espirito Santo.

Principal obra - o livro "Província do Espirito Santo", 513 páginas, publicado em 1879. É dos mais importantes livros de História do Estado; fonte primária da maior parte das pesquisas e publicações posteriores, inclusive desta minha série de "Personagens de nossa História". (o texto integral do livro pode ser encontrado na internet: www.ape.es.gov.br, site do Arquivo Público do Espirito Santo).

Na página 481 do livro está (falando do nosso mármore e granito regional): "Desde a Serra dos Aymorés, atravessando o interior a sahir no município de Cachoeiro de Itapemirim, passando pelos districtos dos terrenos denominados Fructeira, Salgado, Salgadinho, S. Filippe e Muqui atravessa uma mina de pedra calcarea da melhor qualidade e paralella uma outra de christal em uma extensão talvez de 250 kilometros... Existe ainda granitos de diversas qualidades".

Não há, no município, qualquer homenagem a Basílio Daemon, por mais simples que seja, fato que se repete com muitas personagens importantes de nossa história.

 

09 - NEWTON MEIRELLES

Nasceu no Rio de Janeiro em 17/07/1905. Seus pais: José Meirelles Alves Moreira (funcionário da Prefeitura do Rio e deputado federal) e Maria Antonietta Duarte Meirelles. Foi atleta do Botafogo, no Rio.

Foi para Vitória trabalhar no Banco do Brasil; tomou posse em 10/08/1934. Em 1939 transferiu-se para Cachoeiro, como Caixa, cargo em que permaneceu até aposentar-se em 06/08/1964. Não se aposentou - foi aposentado pela revolução de 1964, em virtude de intensa e honesta liderança sindical. É o mais respeitável bancário de Cachoeiro em todos os tempos. Fundador da AABB e do Jardim de Infância.

Interrogado em inquérito militar disse: - "para acabar com a corrupção é necessário educar o povo a ser direito, ser cumpridor de seus deveres. E o governo deve dar exemplo. De que adianta punir o camarada que é ladrão, quando há ladrões no governo?". A mensagem permanece atual e, parece, "ad eternum".

Baluarte de "A Época", jornal dos socialistas cachoeirenses.

Não era dado a escrever, era divulgador de ideias pelo proselitismo e, mais, muito mais, pelo exemplo. Segundo Professor Deusdedit Baptista "carregou o jornal nas costas, no sentido financeiro, verdadeiro idealista". Vereador em Cachoeiro, atuou como verdadeiro parlamentar. Compadre de Newton Braga, foi padrinho de Rachel.

Casado com D. Carmem Vieira Meirelles, não tiveram filhos. Boa parte de sua renda era destinada aos pobres. Ajudou centenas de estudantes, sempre em sigilo. Explorado algumas vezes, como todos benfeitores e idealistas; sabia disso, o que não o impediu de cada vez mais se doar.

Doou à cidade a "Ilha do Meirelles", com 100.000 m2, bem próxima ao centro da cidade, um pouco acima da Ilha da Luz. Segundo ele, a doação se fez "pelo acolhimento que aqui teve, pelas atenções que sempre mereceu, pelo relacionamento com o seu povo e pelas amizades que conseguiu fazer" (como está na escritura de doação de 06/06/1988).

A ilha, esteve com a União Social Camiliana a tempos, e muito bem cuidada. Hoje está miseravelmente abandonada pelo município, seu atual proprietário, num prejuízo para a cidade e para a memória de Newton Meirelles.

Poderia dizer que a ilha foi o maior benefício que nos legou. Não foi. O maior legado e tantos outros, foi seu exemplo: - demonstrar que a pessoa pode ser honesta, viver vida digna e solidária e subir aos céus, ainda que se diga ateu.


Higner Mansur Advogado, guardião da cultura cachoeirense e, atamente, vereador

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