Compaixão é fortaleza - Jornal Fato
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Compaixão é fortaleza

A amizade, daquelas que além das estórias, ditas nas conversas, provocam a preocupação do consolo


Numa dessas tardes quentes, sentados, próximo ao rio, onde cantavam cachoeiros, exclama-me Telêmaco: - estamos perdidos! Surpreso, com a súbita sentença, indago: - por que amigo? Cabisbaixo, responde-me: ao menos por essas bandas do planêta, é o que sinto, todo dia, observando pessoas ao léu, acotovelando-se, sem se olharem. Quando veem-se não se enxergam. Quando enxergam-se, não o suficiente. Daí, então, a conclusão parece ser a do pensamento coletivo, de que cada um deve viver apenas para si e, em relação ao outro o descaso da cegueira. Emocionado, ergue o crâneo e, fitando-me bem, prossegue dizendo: veja, além disso, o falecimento de tanta coisa interessante! A amizade, daquelas que além das estórias, ditas nas conversas, provocam a preocupação do consolo, o auxílio, o entusiasmo e a mão salvadora, a resgatar a alegria da angústia! Concordo com a insatisfação, refletida no desabafo: - a amizade é fruto do amor, a entranhar-se, uma, dentro do outro, durante o tempo, até que, de repente, amigos, tornam-se irmãos. Isto feneceu. São outros nossos dias, agora, mal iluminados, pelo fraco sol da indiferença. Um pouco mais e os lábios cessam. Há silêncio. E percebo Telêmaco lacrimejando. Abraço o amigo, e com poucas palavras, convido a andar. Seguimos a calçada, ilustradas com linhas paralelas, quase apagadas e pouco larga. Adiantamos o passo e, adiante, estamos ali, a contemplar o rio de nossas vidas inteiras, com suas magras águas. Tão magras quanto coisas velhas, desidratando-se, a perder a jovem mudança, para o milagre supremo da transformação. A mesma, que altera a natureza, a cada estação. Finalmente, alegramo-nos, quando lembramos de flores, sucedendo o inverno, sobrevindas com a glória delirante, da primavera. Apesar de tudo, concluímos os versos de Renato Russo: "compaixão é fortaleza".

 

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Aos meus desejos, eis a cota de beijos.

Onde quer que estejam

Entre o povo ou a mulher amada. Os passos de cada bôca.

 

Desejo, também vocábulo, tal o arado, acendendo a chama da vontade, no horizonte da semente, durante a grande viagem cotidiana

 

Desejo, o segredo revelado, sobre a derme, onde dorme a miséria insana, e, então, desperte tanto, moço e a moça, e a matéria da estrela sobre o peito

 

Desejo, um feixe de coisas, peixes multiplicando-se, a vida, vestida de vida, clara e límpida.

 

E a certeza utópica, das horas com amigos, cantando em uníssono, o desejo coletivo. Desejo quão não vejo... amarga-me, feito a face esquálida da pobreza!

 

Depois, durante o infinito

Não respiro, num instante, e reflito

O pensamento infame da bôca faminta, e o corpo extinto, para  ganho da escória, que lucra, a abastar-se

 

Quiçá, num breve segundo, leve, como nós, febris de amor, o deserto árido, se vá, e se apague

 

 

E, assim, brilhe o válido desejo, sob o véu do paisagem, no brasa da manhã, que raia...perfumada.


Giuseppe D'Etorres Advogado

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