NEGRA PARAGUAIA E INDISCRIÃ?Ã?ES VIRTUAIS - Jornal Fato
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NEGRA PARAGUAIA E INDISCRIÃ?Ã?ES VIRTUAIS


Quem, como eu, é do tempo do telefone preto e da internet à lenha, se assusta com a onisciência atual da grande rede. A precisão no monitoramento do usuário detona conceitos (e direitos) como privacidade e intimidade. Isso acabou, já era.

Caiu na rede, babau, é peixe. Desgraça é quando misturam tubarão com sardinha, botam tudo no mesmo arrastão de malha fina e fazem uso indevido do seu nome e imagem para fins comerciais e baixarias afins.

E você não precisa ser nenhuma Piovani, Latino, nem Nicole Bahls. A hora chega pra todo mundo.

Recentemente, família goiana teve que ir à justiça obrigar o Facebook a desativar o perfil do filho morto. A rede ignorava os apelos dos pais, que, além da dor da perda, sofriam com a invasão e gracejos postados na página do filho. Ã? dose.

Aqui no Espírito Santo, há uma semana,  por não retirar um perfil falso no Orkut (ainda existe, creia), a Google foi condenada, pela 4ª Câmara Cível do TJES, a pagar R$ 12.500,00 a um casal por danos morais.

A mulher e seu marido, moradores de Guaçuí, alegavam sofrimento sem fim pela exposição na rede, em duas comunidades criadas para difamá-los, com os nomes de "Maria Batalhão"? e "Gostosona do Fórum"?.

Grupos postavam conteúdos ofensivos e vexatórios da intimidade do casal, entendeu a relatora, desembargadora-substituta Marianne Júdice, que confirmou a sentença de primeiro grau.

Pelos nomes das comunidades, dá pra imaginar o que se atribuía à pobre (e gostosona) Maria Batalhão. Por muito menos "" um singelo anúncio de swing numa revista erótica "" um fogoso casal teve que se mudar de Marapé, nos anos 80, debaixo de execração pública.

Tempos jurássicos aqueles.

Fico a imaginar o arsenal de recursos e ferramentas hi-tech à disposição, hoje,  de quem hospeda sites e blogs e sabe tudo sobre a gente à primeira entrada, ao primeiro clic.

Noite dessas, fui retuitar algo postado pelo jornalista Ricardo Noblat.

 

Em fração de segundos, num átimo, o blog dele "" um dos melhores e mais sérios do jornalismo digital "" me apontou 28 dos meus 5.000 amigos do Facebook que haviam curtido aquela página e me sugeria curtir também.

Que precisão e rapidez, caramba! E olha que nem sou cadastrado no blog do bom Noblat.

Lembro que até 2009, por aí, ainda se conseguia navegar meio anônimo pela internet. Hoje, com o ferramental disponível, e especialmente depois de megafusões de empresas digitais e unificações dos perfis de usuários, só faltam dizer a cor da cueca que você usa.

"Deixe aqui seu comentário, Antonio. Ou você não é Antonio?"?, sugere o UOL, feito o HAL assassino  de "2001 "" Uma Odisséia no Espaço"?. Francamente, há momentos em que é preferível uma adolescente crise de identidade, não saber mais quem sou.

No início do ano, quando a Microsoft forçou a migração de milhões de e-mails do Hotmail "" hoje extinto; Bill Gates o tenha "" para o Outlook e trocou o MSN pelo Skype, arranjou uma confusão dos diabos.

Meu correio eletrônico, que até então tinha só endereços de pessoas mais próximas, de uma hora pra outra viu-se invadido por milhares de estranhos, pegos a laço do Facebook, Twitter e LinkedIn. Um desastre.

Até hoje, o Outlook confunde homônimos, como os dois José Carlos Dias que tenho em minhas redes. A foto de um ilustra o perfil do outro e o outro ocupa o lugar do um.

Como os dois são gente fina, gêmeos univitelinos e parecem não se incomodar, a confusão vai ficando.

 

Algumas trocas, porém, me incomodam. Por exemplo, a que a internet "" à exceção do site oficial do Rei "" faz com as músicas "Negra"? e "Nega"?, ambas gravadas por Roberto Carlos, respectivamente nos discos de 1972 e de 1986.

Há algum tempo, um amigo me presenteou com a discografia completa do RC em MP3. Como à pirataria ganha não se olha a perna-de-pau, só algumas audições depois descobri o engodo.

Em vez da linda e melancólica "?Negra"?, de Maurício Duboc e Carlos Colla ("Ela é quente, quente, quente, como um dia de verão/Como o sol que eu peço tanto/Que me faça igual a ela/Pra que eu viva junto dela/Pra que eu tenha a mesma cor"?), a "?Nega"?, do disco de 1986:

"Bailaba como baila

El viento con las palmeras

Pasé todo mi tiempo viendo

Su piel morena

Cambié todo el camino

Para estar con ella

Piel canela

Yo sólo quería ver el samba

Ella apareció enloquecí

Cuando ella sambó pedí socorro

Ella me sonrió yo descubrí

Piel canela

Piel canela"?

 

Um sambinha plastificado, comercial, de fase pouco inspirada da dupla Roberto/Erasmo Carlos, ainda por cima na versão em espanhol! Caso típico de erro essencial quanto à coisa, aparentemente paraguaia.

Em-mim-mesmando essas importantes elucubrações bucaneiro-musicais, dou-me conta de que o buraco é muito mais embaixo. A internet vai cristalizando versões, equívocos, impressões e erros que acabam prevalecendo sobre fatos e tomando o lugar da História.

A música é apenas a ponta desse iceberg pavoroso. Experimente digitar no Google "Ouvir Música João Bosco"?. Dou a cara do Gilson Leão à tapa se o buscador não o remeter à sertanoja dupla João Bosco e Vinícius.

Do Poetinha e do parceiro do Aldir Blanc, nem tchuns. Apesar de ser um atentado cultural, isso não é o mais grave. Se tem conta no LinkedIn, rede profissional de currículos que se agiganta, você já deve ter percebido quem andou fuxicando seu perfil.

Pois é. A rede entrega tudo, com todas as letras e IPs. Na outra ponta, não adianta desculpa esfarrapada no inbox do Facebook, que dedura a que horas você esteve pela última vez naquele espaço.

Fazendo o quê, meu Deus, batendo papo com quem, àquela hora da   madrugada? Não sei e não me meta na sua encrenca.

Aproveite o friozinho de domingo e dê uma olhada no Whatsapp do seu smartphone. Vai descobrir que o aplicativo foi acessado a última vez às 4:08 AM, provavelmente quando o/a infeliz levantou-se pra ir ao banheiro.

Felizmente, pra ele/ela e pra você, a delação cibernética ainda não refina se foi ao WC fazer o nº 1 ou a nº 2. Há, claro, a improvável desculpa de que que você tenha se levantado pra tomar um prosaico copo d"?água.

Sei.

Em breve, celulares com odores vão entregá-lo de vez. Quem viver, cheirará.

Ã? o fim. Ou será?

MISTÃ?RIOS CACHOEIRANOS ""

 

Qual o argumento usado por Dejalmo Carvalho pra fazer o bom Gurru tomar o banho semestral antes do encerramento da Copa Gazetinha, em 1986?

 

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