A Ã?LTIMA VEZ QUE VI MILLôR - Jornal Fato
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A Ã?LTIMA VEZ QUE VI MILLôR


Corria o ano da graça "" e muita desgraça  do auge da repressão política "" de 1974. Seguindo o mapinha ditado ao telefone pelo Glauco de Oliveira, cachoeirense e secretário de Redação do Pasquim, não tive dificuldade pra chegar ao sacrossanto QG da resistência democrática e sede da "?intelligentsia"? tupiniquim.

Um ano antes, eu conhecera a acanhada sede que ficava na Rua Clarisse "" assim mesmo, com dois "s"? "" Ã?ndio do Brasil, no Flamengo, e fora festivamente recebido pela governanta dona Nelma, que conhecera Cachoeiro, na companhia, nada recomendável mas festiva, do nosso embaixador Carlos Imperial.

Já fora apresentado ao onipresente Jaguar, o papo com Rick Goodwin "" cara da minha idade, que tinha a nobre missão de gravar as famosas entrevistas do Pasquim e também já morara na Capital Secreta "" fluiu bacana em torno das piabas do Itapemirim e me senti em casa naquela zona.

Desta vez era diferente. O Pasquim ocupava um aristocrático sobrado, em estilo normando, no alto da Ladeira Saint Roman, fronteira de Copacabana com Ipanema. Se não era hostil, tampouco me parecia familiar, especialmente na ausência do Glauco e da dona Nelma.

Tinha a desconfortável impressão de que chegara ao Olimpo e encontrara Zeus em pessoa. Millôr Fernandes dava uma bronca homérica, com palavrões entremeados na língua de Shakespeare, no Ziraldo, coadjuvado pelo eterno vilão José Lewgoy, frequentador da patota, e pela Olga Savary, então mulher do Jaguar.

Confundido com um daqueles office-boys que frequentavam a Redação "" Hubert e Reinaldo desenhavam ali seus primeiros traços "" acabei sendo garçom ("pega mais água lá na cozinha"?, ordenou Ziraldo) e testemunha casual das escaramuças daquele genial quarteto.

Olga Savary me filou um cigarro e, aos dezoito anos, ganhei uma cortante e irônica menção do Millôr:

"Você também fuma essa porcaria"??, fuzilou, reduzindo a cinzas meu orgulhoso maço de Gauloises, enquanto Lewgoy tragava uma sofisticada cigarrilha mentolada.

Dei graças a Deus quando o Glauco ("volta lá e pede autógrafo; esse encontro, às cinco da tarde, não é comum por aqui"?) chegou "" duas horas atrasado "", poupando-me o constrangimento do mutismo que me acometera frente a frente com o gênio da raça.

Millôr era tudo. Os outros, incluindo meu ídolo Ivan Lessa, no máximo, semideuses. Presenciar aquela discussão renderia muita história pra contar aos colegas da Casa do Estudante e ao meu Grande Marapé.

Anos depois, mestre Deusdedit Baptista me diria que Millôr já estivera ao menos uma vez em Cachoeiro, sob o codinome Vão Gogo, com o qual assinava colunas nas revistas "Cigarra"? e "O Cruzeiro"?.

Junto com Vinícius de Moraes, Paulo Mendes Campos, Fernando Sabino e outros notáveis, o Filósofo do Méier integrava a trupe de Rubem Braga, quando este, em 1951, recebera o título de Cachoeirense Ausente nº 1.

Foram três dias de porres antológicos, a ponto de um deles "" teria sido Vinícius "" confundir o Hotel Itabira com o trem da Leopoldina que passava ao lado e jamais chegava em Vitória...

O que será do hai-kai, ó gueixa,

agora que Millôr o deixa

Pátria Mãe sem pai? "" A.Miranda

"Conheci Rubem Braga a vida inteira. Li Rubem Braga a vida inteira. Foi, sem dúvida, o ser humano que mais admirei a vida inteira. Ontem, quando vinha de carro pra cá, pro meu estúdio, parado no sinal da Praça General Osório, olhei, como todos os dias, pras janelas do seu terraço cheio de árvores. Sua cobertura agrária, lá no alto, pregada ao morro do Cantagalo. Ao contrário de todos os dias, as janelas estavam fechadas. Pra ele, pra mim, pra sempre. Nunca mais voltaremos lá"?, escreveria Millôr no JB, quando da morte de Rubem, em dezembro de 1990.

Soubesse eu dessa afinidade aquele longínquo encontro da Saint Roman em 1974, teria parafraseado Rubem e dito ao Millôr:

"Sempre tenho confiança de que não serei maltratado na porta do Pasquim, e mesmo que dona Nelma tenha ordem sua para não me deixar entrar, ela ficará indecisa quando eu lhe disser em voz baixa: "Eu sou da terra do Velho Braga..."

Infelizmente, aquela foi a primeira e também a última vez que vi Millôr.

A esta altura, o gênio da raça e inventor do frescobol (palavra que detestava) deve estar tomando Buchanan's com Rubem e Vinícius, enquanto, ao fundo, outro recém-chegado, um tal Chico Anysio, pratica a modalidade cearense do jogo, o bostobol.

Ã? o fim.

CONCRETO QUE NASCE TORTO

A ponte de pedestres da Rua Pedro Dias, tal e qual a mãe do Lulla que nasceu analfabeta, está grávida de incompetências, coitada. Além de barriguda e feia, pode parir novas tragédias.

TEMPLO Ã? DINHEIRO

Já que a cada botequim inaugurado abre-se um templo neopentecostal ao lado, não seria melhor parar como está, passar a régua e fechar a conta? Poupar-se-iam dinheiro, silêncio e pecado.

PERGUNTAR NÃ?O OFENDE

Esse programa de compra de votos por R$ 50,00 da Secretaria de Estado da Ação Eleitoral vai curar também a lordose miserável sugerida pelo monolito vermelho de vergonha da logomarca excludente?

Onde está o diligente Ministério Público Eleitoral que não toma uma providência?

MISTÃ?RIOS CACHOEIRANOS "" Qual a ligação familiar da atriz Lady Francisco, que na juventude foi Miss Minas Gerais, com Cachoeiro? Elyan Pipico Peçanha sabe.

 

 

 

 

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