Transfobia - Jornal Fato
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Transfobia


Duas coisas me incomodam profundamente. A intolerância em todas as suas vertentes, e a hipocrisia. Que também tem raça, classe social e credo religioso.

 

Eu, que não sou paladina da moralidade alheia, e que não me permito esse papel, quero abordar hipocrisia e intolerância citando os dados de duas pesquisas (ou estudos, ou levantamentos) que me chamaram a atenção.

 

Uma revela que o Brasil é o campeão mundial de crimes homofóbicos e transfóbicos, e o risco de um homossexual ou pessoa trans ser assassinada por aqui é 785% superior que nos Estados Unidos, país considerado intolerante e conservador.

 

Os dados foram divulgados pela organização não governamental Transgender Europe, rede europeia de organizações que apoiam os direitos da população transgênera.  O outro estudo mostra os brasileiros ocupando o primeiro lugar no mundo na procura por pornografia transexual no Redtube, um site especializado em vídeos pornográficos.

 

Em relação às mortes, os números da violência contra o público LGBTT são assustadores. Apenas em 2016, 343 gays e trans foram mortas de forma violenta. Isso num país em que é notória a subnotificação destes crimes.  Então muitas outras foram assassinadas e não fazem parte das estatísticas.

 

Os números oficiais são apenas a ponta do iceberg, como reforçam vários especialistas, tanto da área de segurança, quanto de direitos humanos e política de gêneros país afora. Não é caso isolado aqui ou acolá. Acontece em todo o país. Lamentavelmente. Como não citar Dandara, que foi linchada com murros, pedradas e pauladas, inclusive no rosto e na cabeça, no Ceará. Depois foi finalmente morta a tiros. Crime de ódio, como tantos outros.

 

Na minha visão o amor cristão, tão propagado nas igrejas e instituições, é incompatível com a violência e assédios variados sendo praticados em todos os lugares, sob a omissão de instituições e cidadãos, levados à indiferença pelas convenções sociais ou pela falta de empatia.

 

A discriminação e preconceito empurram para a marginalidade as pessoas trans. Elas não conseguem estudar porque são tão ridicularizadas que abandonam os estudos. E se 90% se prostitui, não é por opção. É por falta dela. Porque quem, em sã consciência, escolheria se expor aos riscos da violência, que mostra toda a sua face perversa na calada da noite, horário em que trabalham.

 

Truculência que é muitas vezes praticada pelos maiores consumidores mundiais de pornografia trans. Segundo Carmita Abdo, coordenadora de pesquisas sobre sexualidade do Hospital das Clínicas de São Paulo, as trans estão extremamente vulneráveis. Ela aborda a questão do desejo reprimido, uma vez que o agressor se vê desconfortavelmente atraído. Por isso a agressão para sanar esse desconforto.

 

Carmita tem uma fala que é preciso considerar e avaliar com atenção. "É importante não generalizar. Não se pode dizer que todos os agressores estão buscando matar algo dentro de si, mas parte desse grupo pode, sim, ter esta motivação. As causas variam".

 

E só para confirmar a hipocrisia e contradição. Os Estados mais violentos para travestis e transexuais são os que mais procuram vídeos eróticos com elas. Segundo especialistas, seria um indício de um machismo mortal, que transforma a mulher trans em objeto de desejo e fetiche. Triste constatação. Que a hipocrisia não nos domine.


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