Sobre omissão de socorro e morte - Jornal Fato
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Sobre omissão de socorro e morte


"Vocês são todos iguais. Arrumam confusão a toa".  Esta frase não me sai da cabeça no momento em que vivo a dor do luto pela perda absolutamente inesperada de um irmão. Ela foi proferida pelo médico que deveria tê-lo atendido na UPA do Marbrasa no dia 20 de março.

 

E hoje avalio com absoluta certeza que houve omissão de socorro, apesar do equipamento público ter toda a estrutura. Aferida pressão e glicose pelo enfermeiro, levamos meu irmão para o repouso e o colocamos na cadeira do papai, com ajuda da servidora. Não havia leito disponível.

 

Já havia alertado à equipe que deveria ser grave, já que ele nunca ficara doente. Sem que o médico o examinasse, a técnica de enfermagem veio com o soro e eu indaguei se o médico não iria examiná-lo. Ela afirmou que o médico mandara colocar aquele soro. Diante da minha insistência para que fosse examinado, ela saiu.

 

Em alguns minutos entra o médico. Ignora completamente o meu irmão e diz a frase inicial desse artigo. E foi além, com aquela postura Eu, Deus e o resto. "Ele já poderia estar sendo hidratado e você está atrapalhando". Repito, sem examiná-lo, apesar da palidez, suor excessivo e impossibilidade de andar, já relatada. Deu o recado, virou as costas e saiu.

 

Durante todo o tempo alertávamos à equipe que ele estava piorando. Houve troca de plantão e eu, aflita, bati na porta de dois consultórios, advertindo que ele estava piorando. Um médico, mesmo que educadamente, disse que quem o atenderia seria o colega do consultório ao lado.

 

A aflição me impulsionou a pedir licença e alertar ao outro médico que meu irmão estava ali desde as 6h00 e só estava piorando. Eu, minha cunhada e a filha dele constatávamos isso a todo momento. Já eram 8h00. O médico, também educadamente, me respondeu que o atendimento dos que estavam no repouso seria realizado depois de terminada a fila externa.

 

Por volta das 8h30 meu irmão começou a vomitar e o levaram para o leito de emergência. Várias técnicas, mais o enfermeiro o cercavam. O que nós já imaginávamos, da gravidade do caso, foi percebida por eles naquele momento, quando constataram um bloqueio grave no coração, duas horas e meia depois de dar entrada ali.

 

A partir daí tudo foi muito rápido. Às 9h07 meu irmão deu entrada no Hospital Evangélico, recebeu um marcapasso de emergência e foi direto para a UTI, onde morreu 11 dias depois com complicações variadas. Querem me fazer crer que a demora não interferiu no desfecho. Chegaram a sugerir(vou omitir o nome) que ele morreria a qualquer momento em função dos comprometimentos provocados pela diabetes.

 

Quem convivia com ele sabe que era ativo, subia e descia escadas tanto em casa como no trabalho e nunca apresentou queixas. Não estou minimizando os estragos que a diabetes pode causar. Longe de mim. Fiz uma denúncia na Ouvidoria pela omissão de socorro. O atendimento foi eficiente.

 

Essa semana fui recebida com muita delicadeza pela diretora da UPA, que me informou que o médico foi advertido, apesar de ser um bom profissional, muito querido. Bom profissional não negligencia pacientes. Informou que ele anotara a gravidade na ficha.E a pergunta que não quer calar: Baseado em quê, se nem olhou para ele, e se sabia, por quê não tomou providências?

 

É difícil manter firme a fé que sempre me sustentou. Então creio, com dor na alma, que meu irmão morreu porque estava preparado para o encontro com Deus. Está no céu. Que Deus nos cure e tenha misericórdia daqueles que, podendo fazer o bem, não fazem.

 


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