Cachoeiro Precisa Só de Cachoeiro - Jornal Fato
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Cachoeiro Precisa Só de Cachoeiro


 

Há anos Cachoeiro recebe produtores e comerciantes de HOLAMBRA, em concorrida feira onde se vendem flores e plantas ornamentais da pequena cidade paulista. A feira, no que concerne à beneficência local, é forma séria de o Lyons Clube trazer conforto aos que necessitam de cadeiras de rodas.

 

Há mais tempo ainda, por aqui aparecia a famosa Feira de Ibitinga, para venda de produtos não só artesanais, como roupas e apetrechos de uso pessoal. IBITINGA é pequena cidade paulista, famosa por sua ... Feira. E cá entre nós, dez em cada dez cachoeirenses a quem pergunto onde fica Ibitinga, não sabe dizer. Alguns arriscam Minas Gerais, e não é - é São Paulo, interiorzão.

 

Ao contrário de Holambra, que soube trabalhar com fim social - embora vise lucro como qualquer empreendimento comercial -, Ibitinga acabou por não mais aparecer por aqui, "furada" por interesses políticos e econômicos locais que, incapazes de agir na mesma moeda, acabaram por fulminar experiência comercial tão legal... que recolhia impostos aos cofres de Cachoeiro. Venceu a incompetência cachoeirense, que não soube se aproveitar da experiência da minúscula cidade paulista.

 

Dia desses, apareceu na Praça Jerônimo Monteiro jovem bem simples empurrando carrinho tipo de pedreiro, lotado de artesanato de madeira (tratores, pás carregadeiras, caminhõezinhos, automóveis e outros). Entrevistei o rapaz, que vendeu frente ao Mourads, na hora, uns 200 reais de artesanato. Disse ser de PORTO SEGURO - BA; que tinha vindo com outro amigo e que vendia artesanato de madeira de fabricação, em maior parte, dos índios de lá - pataxós. Enquanto dizia, recebia os "trocados" e exibia sorriso de orelha a orelha - feliz por conhecer a terra de Roberto Carlos (ele quem disse) e faturar graças à disponibilidade em se deslocar e à venda que fazia do artesanato de sua terra.

 

Enquanto isso, para não ficar mal na fotografia - embora fique - a administração pública de Cachoeiro deixa expor, por alguns dias, o artesanato de Cachoeiro, na Praça Jerônimo Monteiro, com pouca ajuda (se há), exceto deixar expor. Quem vê, vê que a cada dia míngua a feira à míngua... você sabe de quê, e não é falta de qualidade ou entusiasmo dos artesãos e artesãs. Sair da cidade com ajuda oficial? Claro, que não.

 

Holambra tem 13.000 habitantes; Ibitinga, 53.000; Porto Seguro 80.000. Somados são 146.000 habitantes e Cachoeiro tem 210.000 habitantes. Entenderam?

 

Ibitinga é Capital Nacional do Bordado e corre mundo; Porto Seguro foi o primeiro lugar onde a esquadra de Pedro Álvares Cabral atracou no Brasil e corre mundo e Holambra, de colonização holandesa, se destaca pela produção de flores e corre mundo.

 

E Cachoeiro? Ora, Cachoeiro é "só" a capital nacional do Mármore e do Granito, terra de Rubem Braga, terra de Roberto Carlos, terra de Sérgio Sampaio, terra de Raul Sampaio, Terra de Luz Del Fuego, Terra de Jece Valadão, Terra de Carlos Imperial, Terra de Marly de Oliveira. E, ainda, Terra de Maria Laurinda, de Canuta Caetano, e de seus clãs quilombolas, com títulos de reconhecimento internacional e nem todos sabemos.

 

Terra de tanta gente importante - a maioria dela, o Brasil sabe. Todos sabem, poucos nos visitam. Nós mesmos não visitamos nossas riquezas, seja do mármore e do granito, seja do nosso artesanato, seja de nossas letras e músicas.

 

Há coisa estranha nisso. Esperamos que o futuro prefeito a encontre, coisa que não fizeram os últimos. Vamos pensando que apenas precisamos de nossa gente, mas só serve gente inteligente.

 

O Que É uma Cidade Criativa?

 

É o título de curioso e importante livro da Editora Senac - SP. É tradução de livro francês, 94 págs. (R$ 52,00), de Elsa Vivant, ligada ao planejamento urbano. Leitura obrigatória para quem quer Cachoeiro melhor, quando nada por trazer (pág. 10), texto que cabe inteiro em nossa realidade de cidade que não cresceu industrialmente nos últimos anos.

 

Estamos acostumados a um palavreado simplório dos políticos (quando não mal-intencionado), de que precisamos trazer indústrias de fora. Meia verdade pois, se são necessárias, mais necessário é a cidade produzir condições próprias de desenvolvimento, aproveitando não só o estrangeiro mas, principalmente, as qualidades locais, aliás como falado na crônica que abre a página.

 

A frase referida: - "Para convencer os executivos das empresas de alto valor econômico a se instalarem nas cidades em declínio industrial, foi dada atenção especial à melhoria do cenário de vida; espaços verdes, espaços públicos e, sobretudo, vida cultural". (Recomendo o livro especialmente aos novos vereadores e a seus assessores - Cidade e Câmara melhor começam com bons leitores de livros essenciais, e não de gente que fica esperando Papai Noel chegar, se é que ele existe).

 

OS DOIS JOSÉ CARLOS AMARAL

 

Fui companheiro de Câmara Municipal do Vereador José Carlos Amaral, por quatro anos e quatro meses. Durante esse tempo e durante o tempo em que me meti em política, sempre vi dois vereadores Amaral.

 

O primeiro, zangado, tinhoso, provocante, insolente e de posições determinadas no momento das brigas parlamentares. Fomos sempre oposição, isto é, eu oposição, ele governo. Vi Amaral extrapolar muitas vezes, e não comigo. Nunca brigamos, nunca trocamos ofensas e creio ter havido mútua admiração naqueles tempos parlamentares.

 

Era difícil dobrá-lo em suas posições. Consegui, vez por outra. Não na base do grito. Na base do diálogo, na base da conversa mansa, na base do olho no olho. Ele não resiste a quem se lhe apresenta de espírito desarmado e com opiniões coerentes. Aí ele se põe também a pensar no que o outro lado pensa e, algumas vezes, cede. Como cedeu (e nós cedemos) quando da elaboração da Lei Orgânica de Cachoeiro, à qual dei boas contribuições, modéstia à parte, e a qual contribuição que dei, como as deram a oposição de três ou quatro vereadores, dadas e aceitas graças a esse lado "vulnerável" de Amaral, que não resiste - embora digam o contrário - que não resiste a argumentos sérios e sólidos.

 

O outro Amaral que conheci não tem fama de bravo; é manso como cordeiro. Nessa época de vereador ele me convidou (uma única vez) para um pequeno churrasco na casa dele. Cheguei no Aeroporto e não encontrei o Amaral irado velho de guerra. Encontrei um Amaral domado, um paizão obediente às ordens de sua mulher e "caído" pelos filhos. Filhos que ele gerou e filhos que ele trouxe do mundo para o seu lar, abrigando-os e dando a eles condições de vida que certamente não teriam se fossem ficar à espera do carinho e da proteção da maioria de nós.

 

É desse Amaral, muito mais do que do outro, que sempre me lembro, mesmo nas vezes em que parece que ele está completamente errado (às vezes está) na tribuna ou em arroubos em jornais, rádio ou televisão.

 

Quem é pai como ele é, não duvidem, é gente fácil de conversar e, se for o caso, convencer. Ligeiro agrado no cangote, como vi fazerem seus filhos, e bons argumentos em favor do melhor, é tiro e queda para Amaral transformar-se num felino doméstico, feliz e cordato (Essas considerações me vieram quando soube que o vereador Amaral, em vez de deixar a vaca municipal ir para o brejo, preferiu alertar o Prefeito sobre o incrível erro de assessoramento que quase leva o Executivo a praticar ilegalidade insanável, que seria a venda de bens públicos sem a necessária autorização prévia da Câmara. Espertalhões não dariam o aviso; Amaral deu. Esse o Amaral que conheci).

 

- crônica publicada em maio de 2005. Onze anos passados, não retiro vírgula e republico homenageando-o novamente, agora que ele não se candidatou.

 

 


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