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Durante seis anos, nas temporadas variadas, em uma segunda-feira, fim de noite, minha atenção se voltava para a televisão


- Foto Reprodução Web

Tempos atrás, uma série televisiva americana tomou meu tempo. Durante seis anos, nas temporadas variadas, em uma segunda-feira, fim de noite, minha atenção se voltava para a televisão. No capítulo inicial, imaginei uma ilha no pacífico, apesar da tragédia e do trauma da queda do avião proveniente da Austrália, um local ideal para os sobreviventes pensarem em suas vidas e aproveitarem o tempo, enquanto o resgate não chegava. Mas, a cada segunda-feira dormia com uma dúvida maior. A ilha se mostrava mágica e os dramas pessoais apareciam cada vez mais evidentes. A ilha, inicialmente paradisíaca, aumentava sua magia a cada temporada. Com poderes de curas, transformações pessoais e coletivas. Em seu interior apareceram outros personagens com atitudes violentas e assassinas. E desta maneira o mistério crescia e aumentava o desejo pelo próximo episódio. Sempre em busca de respostas, as quais nunca aconteciam. Algo instigante e nada mais real e do cotidiano, os conflitos humanos e a busca pela sobrevivência. A ilha continuava a sedução. De uma temporada para outra eram meses de espera, ainda assim, não diminuía o interesse, pelo contrário, só aumentava. Dos momentos iniciais de um grupo de sobreviventes, sua luta pelas necessidades mínimas (água, alimentação e segurança), a ilha desnudava-se cada vez mais mística e nenhuma resposta acontecia. A fantasia transformava a realidade do grupo de sobreviventes. E nós, os expectadores, embarcávamos no mundo daquela ilusão para melhorar a realidade da terça e do resto da semana. Com o passar das temporadas começou a ficar evidente que, o que menos importava eram as respostas, pois, os conflitos apresentados e a mistura de realidade e fantasia confundiam-se com as nossas vidas, e as perguntas apresentavam-se diariamente: Por que vivemos? De onde viemos? Para onde vamos? A ilha parecia dizer: Viva! Busque respostas. Continue questionando. Nos últimos capítulos, o sentimento de perda se aprofundava. Um vazio. Como uma perda sentimental ou material. Porém, superamos. Sempre superamos. Basta o tempo, sempre ele. O responsável por abrandar paixões e diminuir a memória. Um apagador de lembranças. Ele facilita nossas transformações. Ou mesmo, nos mantendo os mesmos, apenas nos levando a pensar diferente, e assim, continuamos a viver, até um novo conflito e embate.

O capítulo final reuniu sobreviventes da ilha mágica em um mundo real. Apresentaram-se em uma cidade americana. Numa igreja, as pessoas ou seus espíritos, encontraram-se aos pares. Cada casal aparentava a felicidade ideal, a solidão de vida anterior havia desaparecido, como se a mitologia, o mito da completude, a união em um ser só, quando na verdade existem dois, fosse possível de se concretizar. Não sei se foi isso o mostrado, pelo menos foi o que imaginei. Se não foi, é o que ficou em meu pensamento e memória. Ou, o que desejei. Desde então, perdi o interesse pelas séries da TV. Assim como perdi o interesse, desde a última largada do Airton Sena, pelas corridas automobilísticas de Fórmula 1.


Sergio Damião Médico e cronista

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