A Volta da Enchente - Agora a Maior - Jornal Fato
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A Volta da Enchente - Agora a Maior

Ao que se sabe, o Prefeito Alexandre Kalil, de Belo Horizonte, foi severamente massacrado quando, recentemente, quis implantar na capital mineira


Ao que se sabe, o Prefeito Alexandre Kalil, de Belo Horizonte, foi severamente massacrado quando, recentemente, quis implantar na capital mineira PDM que cuidasse do meio ambiente. Foi o que achei nas redes sociais, nesses dias pós-tragédias, embora já soubesse de leituras anteriores. Disse o prefeito: - "Eu quero deixar uma coisa muito clara: esse Plano Diretor, que foi tão massacrado por esses empresários gananciosos dessa cidade, está aí a resposta para eles. Eles não queriam um Plano Diretor que cuidasse do meio ambiente. A resposta chegou na casa deles...".

Há décadas, talvez cinco, tento informar coisas assim em Cachoeiro e, por vezes, sou ridicularizado. Embora isso importe pouco, até para evitar disseminar ódio cachoeirense por entre os que perderam tanta coisa; e a maioria não é culpada. E não vou pessoalizar autoridade alguma, muito embora, deva confessar, nos últimos prefeitos daqui, não vejo a coragem e a civilidade do prefeito belo-horizontino. Os prefeitos daqui, inclusive o atual, simplesmente "controlam" o Conselho do Plano Diretor - CPDM - de Cachoeiro, se acolitando com alguns (não todos) empresários que só querem saber de se enriquecer e que se ferre a natureza e que f-se o povo trabalhador de Cachoeiro.

Quando se ler as atas do CPDM, desde o PDU, serão perfeitamente identificados os conselheiros que querem o melhor para Cachoeiro... e não serão muitos. Em compensação, serão dezenas o que trilham do lado contrário. E aqui faço sugestão aos estudantes universitários, principalmente da área ambiental, urbanística e política. O campo será amplo e "riquíssimo". Quem sabe, desses trabalhos, mais e mais cachoeirenses entendam o buraco fundo do rio que nos jogaram esses vendilhões do templo.

Não sei se eles pagarão por isso - refiro-me às distintas autoridades, seus companheiros e aquela parte empresarial local para quem o lucro é o máximo. Torço para que sim.

Pra não entrar muito na questão local, coisa que faço e farei em ocasião oportuna, lembro, também, texto do jornal O GLOBO, de janeiro de 2013, que resume muito bem o assunto e cai como uma luva na política administrativa de Cachoeiro.

Diz o texto: - "- OPINIÃO - BALELA - Infiltra-se no noticiário sobre as chuvas dos últimos dias a ideia de que tudo pode ser explicado pelas "mudanças climáticas". Cabe o alerta: há cíclicas chuvas fortes na região... desde tempos imemoriais. A novidade, das últimas décadas, é o acúmulo do descaso administrativo com o populismo de governantes, causa da leniência no controle da ocupação ilegal de encostas, várzeas e margens de rios. Onde as tragédias ocorrem".

Jaime Lerner, o maior de nossos urbanistas, disse - "não quero falar... de cidades que engessaram seus canais, cobriram os rios, criaram desastres ambientais. Cidades que deram as costas aos rios e que continuaram a descaracterizá-los, transformando-os em locais de inundações, esgoto e lixo. Em atitudes de não reconhecimento dos rios que fizeram sua história".

Até por falta de convite, Jaime Lerner não queria falar sobre Cachoeiro e nunca, nos tempos recentes, foi convidado a vir a Cachoeiro - e agora sua idade não o deixa vir. Mas o cachoeirense Ary Garcia Rosa, outro grande urbanista, deixou sua marca no PDLI - alguém tem cópia dele? - ao dizer, em 1974, portanto a quase meio século:

"- II / 49 - 6.2.2 - Enchentes (causas) - (a) Bloqueamento do Rio Itapemirim pela ocupação total de suas margens na zona urbana; - (b) Desmatamento das cabeceiras do Rio e das encostas do Vale do Itapemirim, que fazem do Itapemirim e sua bacia de constituição um verdadeiro dreno; - (c) Assoreamento do Rio Itapemirim pelos diversos materiais liberados pela erosão, que aumenta a velocidade das águas, diminui a capacidade contenção do seu leito, apressa-lhe a saturação e o faz transbordar; - (d) As áreas construídas ao nível das margens do Rio Itapemirim são as primeiras a serem afetadas diretamente pelas cheias...".

Esperemos pela próxima enchente. Ela não demora a vir.

 

 

A "NOSSA" ENCHENTE

(Trata-se de adaptação de texto da CONEXÃO MANSUR 80, de 08 01 2011 (estamos na CONEXÃO MANSUR 590), cenário que se repete, vez que as causas continuam causando):

O Rio Itapemirim corre às costas da cidade, falha imperdoável não dos primeiros colonizadores, mas, sem dúvida, falha das administrações municipais de tempos mais recentes, que vieram após o crescimento da cidade, década de 1960 e, porque não admitir, falha nossa, cidadãos que temos voz e não a usamos. Falha, não pioneira, do Prefeito Attilio Vicacqua (Decreto nº 5, de 6/8/1920), que autorizou a cessão de terrenos municipais beira-rio, no centro da cidade, para construção com fundos para o rio. Falha de Conselhos Urbanos (CPDM) que se debruçam sobre ninharias e atecnias (p. ex., autorizações esdrúxulas para construções que não cabem nos locais propostos, como a UNES, agora invadida pela enchente).

Quando a cidade deu as costas ao rio, deixamos de vê-lo todos os dias. Todos os dias, um pouco de cada vez, ele morre. Assoreado, se poluindo, perdendo peixes, perdendo a vida. Até que um dia, dia qualquer de qualquer ano e em muitos anos, ele desperta, enche e transborda. Às vezes rápida, às vezes violentamente, reconquista as margens que lhe foram tomadas e impermeabilizadas por asfalto, fundações, levando, às vezes, vidas humanas e, sempre, a economia, fruto do trabalho e patrimônio de centenas de cachoeirenses. E com o avanço cada vez maior sobre o rio, com as cada vez maiores parafernálias elétricas e eletrônicas, o prejuízo se multiplica - o que antes já era muito tomado do cachoeirense, agora, por vezes, é tudo que construiu para ele e família, sem falar nos empregados.

A pesquisa desta CONEXÃO é fruto de labor, não para falar mal do passado, mas para alertar ao presente que o futuro será melhor se, já, começarmos a tratar bem o Rio Itapemirim, fonte da possibilidade de morarmos aqui. COISA PARA CEM ANOS. Sem o Rio não seriamos nada, com ele maltratado e esquecido, um dia talvez voltemos a ser nada, basta ele se revoltar em maior grau, quando o mau tratamento que damos a ele se juntar aos efeitos do clima que, na verdade, ao menos nas enchentes do rio, ainda não estão plenamente presentes...

Não tive preocupação de fazer excessivas intervenções nos textos transcritos, obra a ser produzida por quem se dedique ao assunto, e que precisamos apareça. Não é possível, com tantas escolas superiores na cidade, não haja uma ou não haja grupo universitário ou pós-universitário capaz e com coragem de enfrentar o assunto, que vai além da ciência, chega às barras do poder político inoperante ou permissivo, daí o medo...

Meu esforço, dentro de minhas condições e do auxílio nas pesquisas e discussões, feitas também por e com Maria Elvira Tavares Costa, garanto: quase foram ao limite. Mais não tenho como fazer, se considerarmos que "nossa" enchente se deu há apenas uma semana e os prejuízos mal começam a ser levantados.

Mas fique explícito: o esforço se fez no sentido de despertar o cidadão para que ele tome o pulso de sua cidade, principalmente quando administrações públicas últimas sequer sabem do que estou falando ou do que falam os colaboradores involuntários da CONEXÃO.


Higner Mansur Advogado, guardião da cultura cachoeirense e, atamente, vereador

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