CONEXÃO MANSUR - Jornal Fato
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CONEXÃO MANSUR


 

Vai que eu acerto!

 

Cachoeiro e região têm perdido inúmeras possibilidades de se destacarem por seus atributos naturais e pelos atributos de seus cidadãos. Não há por parte de autoridades, como não há, também, por parte do cidadão - quase não há -exercícios mais profundos de aproveitar o que temos de gente e de natureza.

 

São inúmeros nossos artesãos. Mais ainda os que, se convenientemente treinados e orientados, poderiam produzir peças artesanais que iriam além dos nossos horizontes, gerando riqueza e trazendo, para nossa sociedade, dinheiro para nos fortalecer e nos tirar da penúria atual. Empregos somem aos milhares por aqui, e não se vê autoridade se preocupando - afinal, já se elegeram com uma conversa fiada qualquer e, agora, esperam bovinamente o fim de seus dias de poder. Que se vire o povo, que se vire o eleitor, que se virem as mais de duas dezenas de potenciais e interessados cidadãos em se candidatar ao "palácio" Bernardino Monteiro se é que, ao fim, estes não farão mais do mesmo.

 

Ao lado do nosso artesanato riquíssimo e desprezado, outra possibilidade imensa se perde miseravelmente: são os componentes geográficos da região e de Cachoeiro.

 

Poderia falar de muitos pontos. Pedra da Penha, em São Vicente e de tudo o mais de natureza que existe lá. Burarama, ambiente rural quase inigualável. Ou, ainda, da natureza que se estende pelas montanhas do Caramba e de tudo o que o cerca. E de muitos outros lugares inexplorados.

 

Mas ficarei, apenas, e é muito, com a região do Pico do Itabira, cartão postal local, cantado em prosa e verso por todo poeta e escritor, até mesmo pelo Imperador D. Pedro II, quando costeou nosso litoral, em visita de sul a norte do Estado. Sim, isso mesmo, até Pedro II.

 

E porque fico "só" com o Itabira? Porque, vendo a maravilhosa foto de Paulo Thiengo (sempre ele), foto que emoldura esta página, veio-me ideia de perguntar a quem mora há mais de 20 anos pelas bandas do Itabira - quem nasceu e vive lá - se é normal visitas de gente de Cachoeiro por lá; cidadãos comuns ou alunos em caravanas escolares. Sabem o que respondeu Valquiria Rigon Volpato, a moça que mora, com a família, aos pés do Itabira? - "Não, não é comum que gente, crianças, apareçam para usufruir do cartão postal, da natureza de lá. Que coisa! Certamente assim exclamaria a cronista Marília Mignone, se ouvisse isso e, certamente, é o que ela fará quando ler esta crônica.

 

Cidade cujos administradores não estão nem ai para tal monumento natural; cidade na qual escolas também não vão lá com frequência; cidade aonde o cidadão comum quase que não está nem ai para seu patrimônio; daí é que não podemos esperar nada, nem dela e nem deles, a menos que surja administrador "milagroso", que mais olhe coisas simples e que não gaste dinheiro aos borbotões (dinheiro público, claro) em obras faraônicas, frequentemente inconclusas (ainda assim, o dinheiro é todo gasto).

 

Falo para o povo em geral e para os mais de 20 candidatos a prefeito, em particular.

 

 

Vai que acerto!

 

Fantasma de Meus Tormentos

 

Christian Silva

 

O vislumbre da janela de um ônibus é uma mania peculiar. Refletem-se pensamentos, problemas, a solução destes, e tantas coisas mais...

 

Obviamente não se raciocina por absoluto; basicamente imaginam-se coisas em pequenas quimeras do acaso. Mas, quando, ao perceber que não se está realmente sozinho, e que há, não do seu lado, e sim atrás de você, um alguém, é inquietante.

 

Pior é constatar que quem habita o assento de trás, não está lá. Está e não está. Confuso, não?...

 

É uma criatura de aparência normal, meramente uma pessoa, um homem. Arrepiar-se de súbito, é atitude imprecisa. O melhor é permanecer neutro. O medo, quando ignorado, pode vir a ser facilmente descartado. Mas o instinto é irracional. Você se amedronta. Acovarda-se na sua, feito um garoto que teme um estranho que o fita pelo caminho. Sinceramente, confesso que não reagi deste modo.

 

Me pus a pensar em quem pudera ter sido, o que vivenciara tal criatura hipotética. Talvez um pai de família exemplar, um esposo honrado, um parente insubstituível (como todos o são). Quem sabe fosse um empresário, ou entusiasta do inacreditável. Razoavelmente feliz, devia ter sido, ou alegre pelo menos. Talvez um proletário qualquer, sem esperanças de algum luxo na vida. Ou um aventureiro golpista, perito em enganação alheia e ilusão verbal.

 

Quando, ao acompanhar com os olhos, os velhos e abandonados casebres de um antigo ponto da cidade, pelo qual o ônibus passava, foi que vim perceber que não havia ninguém no assento de trás. Quisera fosse, tudo, só coisa de minha cabeça...

 

Fito a linha do meio-fio da calçada. Acompanhando-a percebo a me encarar, sem expressão adversa, o mesmo ser, surgido de algum recôndito esquecido, de um encargo de consciência. Gelei. Ofegava moderadamente. Nesses momentos é peculiar se lembrar de santos de todos os milagres e preces. Com certeza o mestre de todo o universo é o mais indicado, e pra todas as horas.

 

O intrigante em tudo aquilo, era seu motivo, desconhecido, para tal criatura vir me cutucar. Eu, que estava tão quieto na minha condução, indo à casa de um amigo de longa data, estava inocente de qualquer acusação, até que, se por ventura, isso pudesse vir a ser contestado.

 

Descrente que sou, procurei me esquecer o mais rápido que pude deste meu, fantasma ocasional. Estranhamente, ele já não se encontrava mais em lugar algum.

 

A condução parou no ponto seguinte, onde fiquei. Desci. Precisei atravessar a avenida bem movimentada, exatamente como em capitais de renome. Tudo correu bem, até que, no meio-fio, me distrai com o som de uma buzina nervosa, antecedida por freada brusca e procedida por dois palavrões recíprocos. Um homem de aparência debilitada e vestimentas deploráveis, me veio pedir uns trocados. Não lhe dei atenção.

 

Tentei prosseguir, mas não previa uma grande e quadrada pelo caminho. Tropecei. Ia cair de testa, no meio-fio, não fosse o velho debilitado me segurar pelo cotovelo esquerdo: - Tome cuidado, moço...- falou. Então se virou e seguiu seu caminho.

 

Senti o maior desprezo por mim mesmo. Mas logo depois gelei outra vez. O velho que não me deixara cair de testa no chão era o alguém a quem me neguei dar uns trocados. Mas, mais do que somente isso. Ele era o fantasma de meus tormentos, naquele ônibus.

 


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