Coringa - análise do filme - Jornal Fato
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Coringa - análise do filme

No centro da história um homem com problemas mentais que passa despercebido como bilhões de pessoas em todo o mundo


Quem pensa encontrar no filme o universo de um super herói, vai se surpreender com a narrativa perfeita acerca de um dos mais icônicos vilões de Batman. Desde o início do filme o clima sombrio faz parte de toda a trama. Figurinos que enriquecem cada cena, se integrando ao cenário. Um drama que remete a vários filmes da década de 70. No centro da história um homem com problemas mentais que passa despercebido como bilhões de pessoas em todo o mundo.

Mas quem é Coringa? A história apresenta Arthur Fleck (Joaquin Phoenix) e direção de Tood Phillips e de cara cria empatia com o personagem transtornado. Tamanho o distúrbio que ele mesmo fala de sua risada inapropriada, o afeto pseudobulbar , (problema neurológico que atinge grande parcela da população e que impede o portador de ter controle das emoções). Risada esta que em cada momento reflete exatamente o que a cena se propõe: mexer com o expectador de forma profunda.

Fleck faz terapia. Sim ele tem uma psicóloga e um psiquiatra (que não aparece) mas que cuida desses disturbios do personagem ao longo da trama. Coringa mostra a coragem de aceitar seus (sérios) problemas e procurar apoio profissional. Por aí já merece aplausos.

Aliás o filme fala justamente o narcisismo patológico, sobre a importância de cuidar da saúde mental e como jamais devemos alimentar o ego de pessoas com tendências psicopatas. É ali na atuação magistral de Phoenix que Arthur Fleck nos engana o tempo todo, a ponto de quase acreditarmos em suas histórias. Uma transformação digna de Oscar, onde a certo momento o Coringa é revelado como é: frio, calculista e agente do caos. Coringa é um ser sem limites, perturbado e catártico. Na forma mais sádica possível.

Arthur Fleck tenta sobreviver à decadente Gotham City, onde Tomas Wayne é um candidato a prefeito. É a referência sobre Batman. Fora isso a trama se desenrola independente com uma atuação primorosa, dolorida e autêntica de Joaquin Phoenix. Fleck trabalha como palhaço durante o dia. É humilhado, ridicularizado e desrespeitado. Uma rotina desgastante acompanha o pretenso comediante. Mas é um colega de trabalho que inicia um processo de transformação.

Mas como um sujeito tão miserável vai ganhando o expectador ao longo de sua transformação no Coringa? Uma composição visceral do ator, Phoenix, com direção livre e primorosa de Phillips. E ainda tem a trama paralela de sua infância misteriosa e relação com os Wayne. Fleck cuida da mãe doente com um carinho que humaniza o personagem.

Mas apresenta diversos momentos de apatia quase infantil e apresenta uma pessoa com sérios problemas mentais visto de forma íntima, talvez nunca mostrada. Closes, sons e lágrimas de um homem transtornado que luta para acreditar numa versão que sua mãe lhe contou. Destaque para o caderninho de piadas que ele escreve que e mostra um quase diário de sua vida.

 

Tecnicamente falando os enquadramentos, iluminação, trilha sonora e edição dão ao mesmo tempo sensação de intimidade e superioridade ao tão atormentado Fleck. Até mesmo um romance passa pela tumultuada mente do pseudo comediante.

Comediante este que tenta sucesso à noite nos palcos de stand up até ter a chance de ir no principal programa de TV de Gotham apresentado por outro ator renomado: Robert De Niro que já interpretou um comediante fracassado em um filme de Scorsese, em Rei da Comédia.

Uma das cenas mais pragmáticas é da escadaria que representa a ascensão e decadência do personagem. São momentos de pura poesia, onde o expectador é convidado a todo o tempo a refletir sobre si mesmo e seus traumas e medos.

Nada no filme é realmente o que parece. É preciso refletir cada segundo sobre o que as imagens mostram, e ainda tem várias "pegadinhas" psicológicas ao longo da trama que surpreendem os expectadores.

Ao contrário da crítica que diz que o filme inspira a violência, na verdade o filme mostra a vida como ela é - como diria Nelson Rodrigues. Aliás toda a trilha sonora colabora imensamente para que o filme seja tão bom que dá a impressão que passa rápido.

Joaquin Phoenix foi brilhante ao criar a coreografia do Coringa que aparece em vários momentos e com significados diferentes. Uma leveza insana. O filme é um espetáculo que merece ser visto mais de uma vez, para entender as entrelinhas. O final? bom veja o filme e tire suas conclusões sobre Coringa. Pois cada um vai se emocionar de maneira diferente.


Ramon Barros Comunicador +55 28 99882-8981

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