Ocaso

13/09/2011 22:41

Desde cedo fui levado ao mundo dos livros. A mãe, professora rural, moça e sonhadora, sempre lera. Conheci-a ainda dedicada à leitura. Lia com gosto e me despertava a curiosidade "" A Rosa do Adro, A Vingança do Judeu, O Cisne Negro. O que ela achava de tão interessante naquelas fileiras e pilhas de letrinhas?! E essa curiosidade levou-me a aprender leitura e escrita antes mesmo de poder sentar numa carteira do Grupo Escolar Bodart Junior. Mais tarde, retornando a Cachoeiro, o pai me desencaminhou para os cinemas Central e Santo Antonio. E com ele eu freqüentava as "matinês"? de domingo (é, matinê às duas horas da tarde, que aprendi depois ser apenas uma metonímia).

E foi exatamente lá no antigo e saudoso cine Central que, rapazinho, nasceu nossa paixão. Tá bem, vá lá "" a minha paixão pela linda Elizabeth Taylor, que jamais soube desse amor ou teria ciúmes de Carlindinha, de Regina, de Joanice ou de Maria. Aliás, um amor infiel, como sempre foi o meu, devo reconhecer, pois me apaixonei logo pela Lana Turner, depois a Ana Magnani e ah!, que fascínio!, pela Gina Lolobrígida, com aqueles seios que só podíamos adivinhar. Pouco tempo depois, foi ela destronada pela angelical beleza da Débora Kerr, que não me "quis"? mas quase me matou de susto, e de volúpia, naquela cena do "Quo Vadis?"?, quando foi amarrada ao poste no centro da arena, com um diáfano vestido azul que o touro não respeitaria. E como suei, ajudando Ursus a matar o touro, salvando-a. Por causa daquilo custei a dar crédito de bom ator ao Peter Ustinov, que, como ninguém mais, encarnou o psicopata Nero, que desejei estrangular.

Apesar de tanta infidelidade, o amor pela Beth nunca morreu. Ela era realmente linda, desde o filme açucarado ao lado da cachorra Lassie, até os tempos de ciúme (meu), quando Tyrone Power a beijava. Acho que foi por força desse meu ciúme, inveja minha, que ele morreu no México, durante as filmagens com ela.

E agora, mais de meio século transcorrido, leio que Beth está doente. Sofre com o "mal de Alzheimer"? (o alemão mais detestável) e, naturalmente por isso, não se lembrará mais de mim e dos tantos milhares de fãs, nesse amor platônico que venceu os anos  e me traz essas gratas recordações, de um tempo em que amávamos sem medo da acusação de assédio sexual. Estou preparado para ser um viúvo espiritual. E lembro com saudade daqueles amores impossíveis, quando os jovens sabiam amar, ainda que platonicamente, quando a nossa preocupação maior eram as mulheres e os estudos, os livros.

Não éramos seduzidos pela mediocridade, pois já tínhamos nossos valores morais aprendidos em casa e, por isso, não éramos seduzidos pelos modismos idiotas, pelas drogas, as "músicas"? funk, que fazem mais imbecis e irresponsáveis os coitados que não entenderam que a vida foi feita para viver, amando e sonhando. E, aí está, quando se acaba o sonho e o amor, resta ainda a saudade, a lembrança de ter sido feliz, sem perder a dignidade.

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