Constituição Federal: entre vinhos e lagostas - Jornal Fato
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Constituição Federal: entre vinhos e lagostas

Na semana passada, o Brasil deparou-se com a seguinte notícia


Na semana passada, o Brasil deparou-se com a seguinte notícia: Desembargador do TRF-1, sob argumento de que a licitação de tais produtos não lesa a moralidade administrativa, libera licitação do STF para compra de bebidas, entre elas vinhos, e de comidas, entre elas lagosta.

O artigo 37 da CF impõe a quaisquer dos poderes da administração pública direta ou indireta o respeito aos seguintes princípios: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.

Segundo a CF, moralidade é um dos princípios que norteiam a administração pública. Contudo, em um país repleto de meias verdades, o que é moral?

Para alguns, moralidade é sinônimo de respeito alheio. Para outros moralidade está no veneração as suas crenças em detrimento do pensamento diverso.

As diferentes interpretações giram em torno da origem da palavra: MORAL.

O termo "moral" vem do latim mos ou moris e significa costumes. Vivemos em uma sociedade, esta possui costumes (normas instituídas do que é certo ou errado). Em síntese, a noção de moralidade pode estar associada às noções de justiça, de ação e de dever, pois esta não se relaciona àquilo que cada um quer para si, mas às formas de agir em relação ao outro.

A moralidade administrativa traz em si o significado de que o administrador, no exercício de sua função pública, deve, acima de tudo, distinguir o honesto do desonesto antes de tomar decisões.

Contudo, se a moralidade deve ter por base a ação em relação ao outro e a honestidade, pergunto-me: em um país onde tantos cidadãos enfrentam a miséria é moral que os ministros do STF, enquanto exercem a função de guardiões da Constituição Federal, se alimentem de lagosta e bebam vinhos?

Além do mais, um trabalhador brasileiro não pode consumir bebidas com teor alcóolico durante o trabalho sob pena de ser punido, inclusive com demissão por justa causa. Então, é moral que os ministros da Corte Maior do Judiciário Brasileiro consumam vinhos durante o trabalho? Ou será que eles não trabalham? Vigiar o respeito à Lei Maior do Brasil não é trabalho? Quanto recebem de salário? E de gratificações, quanto ganham? Precisam de vinho e de lagosta também no ambiente profissional, local onde deve reinar a sensatez e a concentração sob pena de promoção de injustiças com repercussões nacionais?

O que é moralidade, pergunto-me? Onde está a impessoalidade e a eficiência dos atos administrativos que despendem gastos faraônicos com compras de alimentos e de bebidas alcóolicas? E, se considerarmos que o Brasil possui cerca de 208,5 milhões de habitantes cuja grande maioria não tem acesso a lagosta e a vinho, não estamos diante do privilégio de 11 trabalhadores, vulgo ministros, que já são beneficiados com jornada inferior a maioria e com qualidade de vida e remuneração incomparáveis? 

O fato de respeitar o procedimento de licitação, torna moral a compra? Será?

Isso é Brasil: moralidade deveria originar não de moral, mas do sufixo "dade" em alguns adjetivos dele derivados, tais como: vaidade, arbitrariedade, maldade, impunidade...

Para os Ministros do STF comerem lagosta com vinho durante o trabalho, é moral. Para o resto do Brasil a moralidade está na marmita gelada, na salada mal lavada e no ovo com arroz e feijão. Parabéns, judiciário, sabe como ninguém promover a efetiva justiça e definir moralidade!

 

Katiuscia Oliveira de Souza Marins

 

 

 


Katiuscia Marins Colunista/Jornal Fato Advogada e professora

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