Transfusão: advogada e religioso analisam recente decisão judicial

Em Cachoeiro, existem seis congregações das Testemunhas de Jeová, com cerca de 500 membros; religião considera sangue símbolo sagrado da vida e por isso não deve ser compartilhado

27/09/2024 16:06
Transfusão: advogada e religioso analisam recente decisão judicial /Divulgação

Na última quarta-feira (25), o STF decidiu por unanimidade que pacientes adultos e capazes têm o direito de recusar transfusões de sangue por motivos religiosos e optar por tratamentos médicos comprovados que não envolvam o uso de sangue. 

Esta decisão defende os direitos dos pacientes para todos os brasileiros, segundo a advogada cachoeirense Luanna Figueira. 

 

 

O STF analisou dois casos envolvendo Testemunhas de Jeová que tiveram o direito de tomar suas próprias decisões médicas negado, devido às suas crenças religiosas. 

Em um dos casos, observa Luanna, o ministro Gilmar Mendes enfatizou a importância da autonomia do paciente.

O Supremo Tribunal Federal (STF) definiu que a liberdade religiosa de uma pessoa pode justificar o custeio de tratamento de saúde diferenciado pelo poder público. 

Por unanimidade, ficou decidido que Testemunhas de Jeová, adultas e capazes, têm o direito de recusar procedimento médico que envolva transfusão de sangue. 

Também decidiram que o Estado tem a obrigação de oferecer procedimentos alternativos disponíveis no Sistema Único de Saúde (SUS), ainda que seja necessário recorrer a estabelecimentos em outras localidades.

Dessa forma, de acordo com a advogada, o resultado do julgamento reafirma a posição do Supremo em favor da liberdade religiosa, compatibilizando-a com os direitos constitucionais à vida e à saúde, visto que o SUS continuará observando o direito á vida, porém, utilizando outros mecanismos para que isso, ocorra, quando a transfusão não for autorizada. 

A opção pelo tratamento alternativo deve ser tomada de forma livre, consciente e informada sobre as consequências e abrange apenas o paciente. Quando estiver em jogo o tratamento de crianças e adolescentes, deve prevalecer o princípio do melhor interesse para a saúde e a vida desse grupo - ou seja, a liberdade religiosa não autoriza que pais impeçam o tratamento médico de filhos menores de idade, esclarece Luanna, que também é professora universitária, doutoranda em Sociologia e Direito pela UFF.

"Sendo assim, o STF por meio da sua decisão, concretizou uma imensa discussão existente no Judiciário, da possibilidade ou não, de negativa, por meio do paciente que é Testemunha de Jeová, à transfusão de sangue", conclui a advogada.  

 

Testemunhas de Jeová

Em Cachoeiro de Itapemirim, existem seis congregações das Testemunhas de Jeová, com cerca de 500 membros, segundo o ancião Morgan Fonseca Santiago. 

"Estamos felizes que, em ambos os casos, o STF tenha defendido unanimemente os direitos dos pacientes de tomar decisões médicas informadas com base em suas crenças", declara o religioso. 

Para as testemunhas de Jeová, o sangue é um símbolo sagrado da vida e por isso não deve ser compartilhado.

Há também fundamentos científicos, quanto aos riscos decorrentes de transfusões, como doenças transmitidas pelo sangue, reações do sistema imunológico etc.

"O ministro André Mendonça observou que a decisão do STF 'derruba qualquer preconceito' contra tratamentos e procedimentos médicos que evitam o uso de transfusão de sangue. Ele destacou que existem numerosos documentos e estudos nacionais e internacionais que demonstram claramente a eficácia desses tratamentos, tanto que não só a comunidade internacional, mas também o Sistema Único de Saúde (SUS) reconheceu sua eficácia", ressalta Morgan. 

Essas decisões, reforça o religioso, estão de acordo com deliberações de tribunais internacionais. 

"Dias antes do julgamento do STF, a Grande Câmara do Tribunal Europeu de Direitos Humanos (CEDH) confirmou que os pacientes têm o direito fundamental de escolher seus próprios cuidados médicos", argumenta Morgan, referindo-se ao caso "Pindo Mulla vs. Espanha".