Advogado fala sobre mandato no Conselho Federal da OAB - Jornal Fato
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Advogado fala sobre mandato no Conselho Federal da OAB

Advogado tributarista de Cachoeiro encerra seu mandato de três anos com conselheiro federal da OAB


Foto: Divulgação

Tendo encerrado em fevereiro seus três anos de mandato como conselheiro federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), o advogado tributarista Henrique Tavares (que sempre viveu em Cachoeiro de Itapemirim) concede esta entrevista exclusiva ao jornal Fato, em que apresenta detalhes da sua atuação e fala da importância do Sul do estado ter conselheiros federais e dos desafios atuais da advocacia brasileira.

 

"Nesses últimos três anos, a vida no Brasil foi bastante complicada no aspecto político, e nós participamos disso diretamente"

 

FATO - Salvo engano, você foi o único advogado atuante no Sul do Espírito Santo a participar do conselheiro federal da OAB além de Atílio Vivacqua, que presidiu a ordem entre 1952 e 1954 (depois de ter sido seu secretário por muitos anos).

Henrique Tavares - Isso já tornou a participação interessante por si. É uma experiência muito especial, bem diferente da rotina, porque o conselho federal, além de exercer a função de órgão máximo da OAB, é uma entidade da sociedade civil que participa de vários movimentos nacionais relevantes. Por exemplo, nesses últimos três anos, a vida no Brasil foi bastante complicada no aspecto político, e nós participamos disso diretamente. A OAB apresentou dois pedidos de impeachment de presidentes da República. Também apresentou, logo no início do nosso mandato, denúncia em face do então presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (o que inclusive o levou a realizar investidas contra a OAB). A experiência de estar em Brasília dentro de uma organização assim dá a dimensão tanto da força da OAB, quanto de como funciona o Poder Judiciário em Brasília.

 

Além de atuar com conselheiro federal, você também participou de alguma comissão nacional específica da ordem, simultaneamente?

Participei da comissão nacional de estudos tributários, que nesse período teve conquistas importantes. Um exemplo é a liminar (em vigor até hoje) que impede uma cobrança que os governadores desejavam (mas seria inviável para as micro e pequenas empresas), determinando o recolhimento de ICMS no estado de origem e no estado de destino de uma compra, conhecido como Difal. Ora, é inviável para as empresas do Simples conhecerem as regras de ICMS para cada estado. Empresas de todo o Brasil ganham com essa medida, de cuja produção nós participamos diretamente, enquanto membros da Comissão Nacional de Direito Tributário da OAB. Além disso, a comissão promoveu eventos importantes para discutir e promover a Reforma Tributária (que, infelizmente, não está entre as prioridades do governo federal).

 

Você compôs mesas de eventos nacionais da OAB sobre a reforma tributária.

Sim, mas também participei de outra comissão, a segunda câmara de processo ético disciplinar, que é o que recebe e analisa denúncias sobre o código de ética da OAB, em nível nacional, o que nos permite conhecer melhor também a atuação dos advogados por todo o Brasil, sejam grandes ou pequenos escritórios, sejam em grandes capitais ou em cidades menores.

 

No plenário do Conselho Federal da OAB, você atuava como suplente ou como titular?

Atuava como titular nas vacâncias, porque tínhamos uma regra interna de rodízio. Na votação sobre o impeachment da presidente Dilma Roussef eu não participei, mas na votação do pedido de impeachment do presidente Michel Temer eu votei representando a OAB/ES, ao lado do então presidente Homero Mafra.

 

E porque era importante para você ser conselheiro federal da OAB?

Eu nunca tinha mirado isso, de fato. Mas já era conselheiro estadual da OAB havia seis anos, atuando também como presidente da comissão estadual de Estudos Tributários havia quatro anos. Então, quando houve a composição da chapa para a nova eleição, em 2015, decidiram que uma das vagas para conselheiro federal seria para Cachoeiro de Itapemirim e aí meu nome surgiu entre as lideranças, também devido aos então mais de dez anos de atuação do escritório de que sou sócio (o Tavares e Giro Advocacia) no estado como um todo, sempre tendo como base o Sul do estado. Felizmente, também tive condições de aceitar essa oportunidade única.

 

Antes disso, como conselheiro estadual e membro da comissão de Estudos Tributários da OAB/ES, houve conquistas importantes para a sociedade?

Sim, como o que passou a permitir a defesa dos contribuintes, representados pelos seus advogados, ainda na primeira instância da Receita Federal. Foi uma vitória da Comissão Estadual de Estudos Tributários que acabou tendo impacto nacional, tendo sido noticiada até pelo jornal Valor Econômico. Foi decorrente, é verdade, de um movimento nacional das comissões estaduais de direito tributário, mas efetivamente foi a comissão capixaba que obteve essa vitória, por meio de uma liminar.

 

Como é atuar em uma comissão nacional de um tema tão complexo quanto o direito tributário brasileiro?

Um grande desafio. Exige uma dedicação de tempo grande. A comissão é composta por muitos professores universitários renomados, juristas. Então, para dar um voto,  é preciso estar muito bem fundamentado, tecnicamente. Daí que também foi uma grande oportunidade ter sido ainda representante do Conselho Federal da OAB na formulação das provas da OAB para a área de Direito Tributário.

 

Do ponto de vista do que interessa à sua atuação profissional como advogado (e também dos clientes da sua sociedade de advogados), que relevância tem você ter atuado esses três anos como conselheiro federal?

Apesar de o meu escritório de advocacia já ter 16 anos e uma atuação importante nos tribunais (tanto nos estaduais, quanto nos federais, superiores), foi bastante interessante e especial conviver com a realidade jurídica de Brasília e participar efetivamente da atuação institucional do Conselho Federal da OAB junto aos tribunais superiores. Essa experiência fez com que aqueles ambientes não fossem mais de visitas ocasionais. Conheci muito melhor a cultura dos órgãos em nível federal. Dá para ter uma participação mais especial junto ao conselho de recursos fiscais da Receita Federal, o Carf, por exemplo, participando mais ativamente do dia a dia desses órgãos, conhecendo os julgadores e os colegas que atuam continuamente nas cortes da Justiça, até mesmo porque é papel do Conselho Federal da OAB eleger um quinto dos ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e dos tribunais regionais federais. Então a gente participa de eleição de nomeação de advogados que vão se tornar ministros do STJ e desembargadores desses tribunais. O mesmo ocorre com os representantes da OAB tanto no Conselho Nacional de Justiça (CNJ), quanto no Conselho Nacional do Ministério Público, e lá a gente tem a oportunidade de ter um relacionamento estreito com eles. Toda essa vivência é importante na atuação nos tribunais superiores, o que agrega muito tanto para mim, quanto para a atuação do meu escritório.

 

Além do relacionamento, tem o contato com matérias e abordagens novas.

Matérias, teses novas, o próprio relacionamento com os colegas? A comissão dos estudos tributários do conselho federal agrega os principais tributaristas dos estados. Você tem membros, sócios de grandes escritórios, e você cria relacionamento com essas pessoas, partilha teses, partilha informação.

 

Então agrega relacionamentos não só em nível federal, mas também com todos os estados brasileiros.

Sem dúvida nenhuma. E por conta disso, agora, em todo estado do Brasil eu conheço alguém especialmente na área tributária.

 

Para o Sul do Espírito Santo, que importância tem alguém tão jovem quanto você ter contado, desde já, com toda essa nova experiência.

Em primeiro lugar, é muito importante para a OAB que o interior, e não apenas Cachoeiro de Itapemirim, tivessem tido essa oportunidade, mostrando que a advocacia do interior tem capacidade e estava representada no conselho federal. Porque as dificuldades que a gente passa no interior nem sempre são as mesmas dos advogados da capital. A gente tem demandas específicas relacionadas ao fato de estar numa cidade menos atrativa do que as grandes capitais. A gente conhece as dificuldades de atuar em lugares ainda menores. É importante poder levar essa experiência, essas demandas, daqui para lá. O ex-presidente da OAB Claudio Lamachia, com quem atuei no mesmo mandato, sabia da importância disso - tanto é que veio a Cachoeiro de Itapemirim duas vezes.

 

Ele veio a Cachoeiro em duas oportunidades...

Desde que eu me graduei em Direito, há 16 anos, nenhum outro presidente do Conselho Federal da OAB tinha vindo a Cachoeiro, e o Lamachia veio duas vezes, inaugurou a subseção de Guaçuí etc. Então isso diz muito também do que é você aproximar a advocacia do interior da OAB nacional. Mas agora voltamos a não ter conselheiro federal aqui, e acredito que os colegas devem sempre exigir para termos. É importantíssimo que, tanto no conselho seccional (da OAB/ES), quanto o conselho federal, estejam efetivamente representados todos os advogados do estado. A minha experiência como conselheiro federal também me deixou muito mais seguro a respeito dessa defesa.

 

Terminado o mandato, quais os desafios que você observa para a advocacia brasileira?

O conselho federal reúne de certa forma todas as demandas da advocacia brasileira. E lá eu vi que a advocacia toda passa por uma transformação muito grande. Os meios de comunicação (de atualização da informação, com o acesso cada vez mais disseminado principalmente da informação jurídica) estão criando outro panorama para o serviço jurídico. Se você procurar uma resposta jurídica no Google, muito provavelmente terá como primeira opção um site que rapidamente vai lhe oferecer o serviço de um advogado. Isso quebra um pouco algo que sempre esteve presente na advocacia, que é a questão da confiança. O serviço jurídico, muito parecido com o médico, ele sempre esteve relacionado com a confiança. Afinal, você vai colocar em jogo a sua liberdade, a sua vida, o seu patrimônio e o problema que lhe aflige. É que hoje isso é contratado em um clique. As pessoas tiram dúvidas na internet e tomam decisões com base em consultas feitas na internet. O conselho federal tem discutido essas questões: existe um problema ético que tem que ser enfrentado principalmente não em face dos colegas, mas entendo que em face aos sites fazem essa promoção do oferecimento disseminado do serviço jurídico. Por outro lado, a advocacia e a sociedade precisam se entender a respeito dessa nova realidade. Também existem por um lado as restrições à propaganda jurídica e por outro lado os sites que, dia e noite, oferecem advogados da sua região que estão cadastrados em uma lista. Volto a dizer: o problema não está com os colegas (todo mundo está tentando sobreviver). Esse é um desafio a que o conselho federal não está alheio.

 

Existe algum outro desafio relevante?

Existe um outro desafio relacionado ao primeiro, porém que diz respeito à contratação de correspondentes jurídicos. Quando me formei, quando um escritório de Vitória precisava de um correspondente em Cachoeiro, ele buscava alguém de sua confiança. Hoje, muitas vezes, faz-se um leilão para ver quem cobra mais barato. Isso prejudica o mercado dos advogados, consequentemente a qualidade do serviço prestado. Também é verdade que isso tende a acabar como um todo, já que os processos hoje são cada vez mais virtuais. Enfim, são tempos novos para todos os advogados e para a sociedade, em que as consultas dos clientes também muitas vezes são feitas de maneira precária.

 

Até por meio do WhatsApp...

É como uma auto consulta, certo? Tem grande chance de dar muito errado. Se fizer uma pesquisa sobre lei de locação, encontra milhões de jurisprudências. Tem para todos os gostos. Mas qual dá segurança jurídica à demanda do cliente? É o advogado que tem a informação jurídica para interpretar o que os tribunais têm decidido, o que o juiz da vara de cada cidade tem decidido sobre o assunto - e são esses tribunais, é esse juiz que vai julgar o seu processo. Então, nós precisamos pensar, para o bem da advocacia inclusive, em todos os prejuízos, inclusive, que podem decorrer dessa nova realidade.

 

Esses são os principais desafios?

Sem dúvida. Tanto para a OAB, quanto para os advogados, é muito importante buscar saber como a advocacia vai se portar dentro dessa nova realidade.

 

 

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