A indiferença pelas mais de 100 mil vítimas da Covid-19 - Jornal Fato
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A indiferença pelas mais de 100 mil vítimas da Covid-19

O Brasil passou de 3 milhões de infectados


Foto: reprodução/98FMNatal

Com quase cinco meses do início da pandemia no Brasil, chegamos aos mais de 100 mil mortos pelo coronavírus. Entre esses mortos, há pessoas da família do meu esposo, que, claramente, é minha família. Ultrapassamos a marca de três milhões de infectados, e, entre os que pegaram o vírus, estão outros familiares nossos, que estiveram bem mal e que pela graça de Deus, não se foram também.

Não estou aqui falando sobre o que deve abrir, o que não deve abrir, como as pessoas devem se portar para evitar que a Covid-19 se espalhe. É inevitável que a vida volte ao normal, nada pode ficar parado pelo resto da vida. Eu falo sobre como a pandemia me fez enxergar as pessoas. Muitas delas acompanhadas por mim nas redes sociais, ou pessoalmente, durante anos, por causa das afinidades. Enfim, vi tantas pessoas dizerem que "ok, todo mundo vai morrer um dia", "mas o câncer também mata milhares de pessoas", "o infarto mata mais que a Covid", "isso tudo é exagero". Com isso, e muito mais que li e ouvi, a admiração deu lugar à decepção.

Até aonde vai o exagero, eu não sei. Que todo mundo vai morrer um dia, é óbvio! Mas, na nossa família, morreu um homem com a idade aproximada do meu marido, bem de saúde. E eu pergunto se não fosse a Covid-19, ele teria deixado a esposa viúva tão cedo? Ou ele viveria até os 90 anos? E aquela moça que estava com câncer, e que tinha uma boa expectativa de vida, se não tivesse pegado o coronavírus, ainda assim estaria fadada a partir antes do esperado? E o avô, que amava brincar com seus netinhos, que tinha saúde e poderia ter vivido pelo menos mais cinco anos, mas que também morreu por causa da doença?

Não é o fato de as pessoas pegarem ou não, morrerem ou não, o contágio vai acontecer. A questão é: para onde foi a sensibilidade das pessoas? O que aconteceu, que de uma hora para a outra, desapareceu? Por muito tempo fiquei incrédula com gente que se diz cristã banalizar milhares de vidas, zombar daqueles que declaram luto pelas vidas perdidas. Não só isso. Relevar a vida de PESSOAS, que tinham famílias, que eram avós, pais, irmãos, filhos ou amigos de alguém. Eram amadas, queridas e morreram, deixando o seus em desconsolo.

Chegamos aos 100 mil mortos e eu ainda escuto muita gente dizer que nem todos morreram por Covid, que o número foi inventado e tantas outras sandices. É doloroso ouvir que as pessoas que morreram da nossa família, ou pessoas conhecidas, foram só 'números inventados'. Com o meu trabalho, falei com pessoas que perderam seus entes queridos para a Covid-19, e vi seus sofrimentos. Não eram só números.

Sabe aquele ditado, "só quem sabe a dor do calo é quem calça o sapato"? Pois é. Só sente a dor quando ela se aproxima. Mas, enquanto ela não chega (e não desejo que isso aconteça com absolutamente ninguém), é fácil "rir" da desgraça alheia e dizer que "tudo bem, vai morrer muita gente e vida que segue".

Talvez você ou eu, ou alguém que conhecemos fique doente por causa do vírus. A pandemia pegou a todos de surpresa em um ano que já começou muito sofrido para muita gente. Não estou dizendo que as pessoas não vão ficar doentes ou morrer. Temos que ter o pé no chão e estarmos preparados para a morte. Contudo, o ponto é que por questões políticas ou ideológicas, ou simplesmente por influência de outrem, ou sei lá mais o quê, muitos ignoram o número de novos casos que ainda é grande no Brasil. Se acredita ou não na veracidade dele, é coisa pessoal, mas ter empatia é o mínimo necessário. Acolher os que sofrem é preciso. Dar a mão e o braço para aqueles que perderam alguém, é preciso. Ou, até mesmo, chorar a dor do outro. Não menospreze a tristeza de quem perdeu alguém, seja pela Covid ou por outra doença. Tenha empatia e amor pelo próximo, porque a sua indiferença machuca muito mais.


Dayane Hemerly Repórter Jornal Fato

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