Só o povo salva o Brasil - Jornal Fato
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Só o povo salva o Brasil


O velho negro de boa estatura, mas franzino, tem barbas e cabelos brancos que mostram a passagem dos anos.  Sai desencantado de uma dessas casas de empréstimo para aposentados, que não exigem avalista. É necessário "apenas" autorizar o desconto do valor contratado do benefício do INSS.

 

Sou abordada de forma tão natural, como se fôssemos velhos conhecidos. E confesso que de certa forma o olhei como se fosse realmente alguém da família. "Minha filha, a gente trabalha a vida toda e no fim o dinheiro não dá para pagar nem os remédios. Aí a gente vive fazendo empréstimos e quase não recebe nada de aposentadoria".

 

Naquele momento senti a dor de um negro, pobre e provavelmente morador de periferia, que trabalhou a maior parte da vida, mas não teve a sua dignidade garantida no tempo que deveria ser de descanso e contemplação da vida.

 

Revoltado, diz não se conformar de ouvir todos os dias sobre os bilhões desviados por políticos de todos os partidos, sem que ninguém faça algo de verdade. Parece brincadeira, reclamou mais uma vez. É muito barulho e pouco resultado. São as famílias de sempre que roubaram o Brasil a vida toda.

 

E exemplificou: gravaram o presidente e mandaram 84 perguntas para ele, mas já falaram que ele pode dizer que não sabe. Responde só se quiser. Claro que ele não vai saber de nada. Eles nunca sabem. Nunca viram, mas o dinheiro sempre some e a gente não tem acesso a nada. Eles cada vez mais ricos e nós, trabalhadores e pobres, cada vez mais miseráveis.

 

Realmente consegui sentir a revolta daquele senhorzinho tão fragilizado pela decepção de um país governado por ladrões. E me surpreendi pelo conhecimento em relação ao cenário político no Brasil. Mas depois refleti melhor e acho que realmente é muito difícil alguém não saber o que está acontecendo, mesmo que as notícias que chegam sejam a que interessa à grande mídia divulgar.

 

Não dá para ignorar porque o pobre sente no bolso. Com muito ou pouco conhecimento acadêmico, o velhinho acertou naquela análise dolorida. Por causa das coisas que compra a menos todos os meses, das dificuldades que passa, na quase mendicância, quando muitas vezes recorre aos amigos ou aos empréstimos. Situação realmente de humilhação recorrente.

 

Se para a maioria do povo brasileiro as coisas vão de mal a pior, o mesmo não acontece com os medalhões da política nacional. As gravações revelam o que já se sabe de longa data. É corrupção sistêmica e histórica. Sob as bençãos e proteção dos figurões de todos os poderes.

 

Mas existem perguntas que precisam ser feitas. Porque tratamentos tão diferenciados para o mesmo crime? Porque esses vazamentos seletivos? Até quando os interesses escusos dos detentores do poder político e econômico continuarão sendo preservados? Quem continuará dando as cartas? Em quem acreditar?

 

Se não há inocentes nem santos nessa história, que todos recebam o mesmo tratamento. Que não sejam tratados a pão de ló, como diria minha saudosa avó. Mas quando se tem podridão e corrupção em todas as esferas de poder, muitas outras perguntas surgem.

 

Quem matou Teori Zavaski? Quem matou o delegado federal que investigava o caso, enquanto se divertia em sua hora de folga? Quem será o próximo da lista daquele que foi surpreendido pedindo R$ 500 mil para pagar advogado, mas depositou na conta dos Perrela, aqueles mesmo do helicóptero pego em terras capixabas com 500 kg de cocaína (esse povo gosta desse número hein?).

 

Quem pegaria os R$ 500 mil? "Alguém que a gente possa matar". Já estão matando o povo brasileiro de frustração, tristeza e inanição ao retirar direitos e negar o acesso ao básico. Quanto aos crimes de mando dos poderosos, ficam impunes.

 

É lamentável que o desabafo daquele negro velho não seja um fato isolado. Só o povo salva o país. Estamos esperando o quê?


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