Sem resposta - Jornal Fato
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Sem resposta


Desde as últimas eleições, a briga pontual entre "os dois lados" da disputa tornou-se uma guerra robusta entre conservadores e progressistas. Aliás, virou luta livre, porque nossas leis parecem não ter alcance nenhum sobre conflitos motivados pela discordância de opiniões. Assim, um grupo pode ameaçar fisicamente uma pessoa que passa pela praça ou escorraçar pela internet alguém que simplesmente defende a valorização da linguagem popular, que fica tudo nisso mesmo. Que se matem todos nos ringues reais e virtuais.

 

A simples lembrança de casos assim  faz a gente perder um pouco a alegria do dia. O mesmo acontece quando se abre um jornal e encontramos mais uma notícia sobre o retrocesso no quadro de conquistas sociais no país - o anunciado fim das universidades públicas, o encolhimento do SUS, o aumento da idade e redução do valor das aposentadorias, o corte de programas como o Bolsa Família e o Ciência Sem Fronteiras, enfim, todo este novo cenário que promete um saque à classe média e o sufocamento dos mais pobres.

 

Então, olhamos para o lado e vemos que há pessoas comemorando. "Teremos uma nova economia, um novo país", exultam, como se esta nova economia e este novo país estivessem sendo construídos para pobres e trabalhadores. É preciso dar um beliscão nesse povo para que acorde: você é milionário ou vive de salário? Quando estiver idoso vai viver de renda e juros ou vai depender de aposentadoria? Sua família inteira pode pagar pelos mais caros tratamentos de saúde ou busca atendimento no SUS? Prefere a certeza de pagar pela faculdade ou tentar uma vaga gratuita, com cota ou sem cota?

 

Mas parece que nada disso faz efeito. Como o negro que nega a sua cor, o gay que esconde de si mesmo sua condição, o pobre - e aqui eu incluo toda a classe média, todo mundo que não é realmente "rico-milionário", como diz uma tia minha - o pobre muitas vezes não se reconhece como tal. Aí, o caminho é dramático: ele compra um carro novo em 48 prestações e tem a ilusão de estar enriquecendo. Breve serei um deles, pensa. Isso, quando já não acha que é rico mesmo. E então começa a defender os interesses do patrão, seja este patrão o remediado dono do mercadinho ou o bilionário dono do maior banco do mundo.

 

Talvez a minha interpretação esteja errada, mas não consigo ver outra razão para que alguém defenda medidas que somente beneficiarão os outros - outros que já foram demasiadamente beneficiados ao longo de uma história milenar de exploração. Se é para defender interesses alheios, por que não defender os daqueles que estão ainda mais necessitados do que nós? E por que não defender os nossos próprios interesses, em vez de deixarmos que joguem tudo na conta abarrotada dos donos do mundo? Se alguém souber a resposta, que me conte. 


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