O Preço da Coisa - Jornal Fato
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O Preço da Coisa


Depois de uma festa boa regada a cerveja e tequila acordo mais cedo do que gostaria ou merecia acordar. Ressaca. Não uma ressaquinha qualquer que é resolvida com dois comprimidos de neosaldina e alguns litros d'água. Ressaca astronômica. Mesmo. Dessas que mais parecem virose. É o preço dos exageros cometidos. Mas a noite foi boa e me entrego ao quarto escuro com as lembranças de ótimas gargalhadas, amigos queridos e pés doendo de dançar. Não há ressaca moral, o que torna minha convalescença mais possível de ser superada.

 

Aprendi muito cedo que é assim. Para cada ação ou omissão, um preço. A dor de barriga pelo excesso de doces, a enxaqueca pelo excesso de tarefas, a decepção pelo cúmulo de acreditar nas pessoas erradas, a dor na coluna pela falta de postura ou a falta de dinheiro pelo vestido de preço exorbitante. Das mais simples até as coisas mas complexas estamos todos pagando. E o preço fica mais alto quanto mais nos tornamos adultos. Talvez por isso muita gente insista em não crescer. É caro esse lance de se responsabilizar pelos próprios atos.

 

Assinar papéis não é mais a brincadeira de quando eu era criança e treinava para ter uma assinatura enorme e cheia de rabiscos e pontos como a do meu pai. Coisa, aliás, que nunca consegui ter. Você assina um papel e sua vida muda. Você casa, descasa, contrata, compra, vende, aluga e autoriza escrevendo seu nome de forma personalizada. Há risco de se arrepender, do dinheiro acabar ou do negócio não ser tão bom quanto você esperava que fosse. Ficou triste, sem grana ou desiludido? É o preço. Na maioria das vezes nem dá para voltar atrás. O jeito é aguentar, quitar a dívida e esperar por dias melhores.

 

Assim é no amor. Não há rede de proteção para quem se entrega. Você se apaixona porque ele fecha os olhos quando sorri, porque ele sabe passar as mãos no seu cabelo como nenhum outro antes, porque ele fala fluentemente sobre política ou porque ele sabe cozinhar e faz o melhor macarrão do mundo. Você ama aquele homem porque ele sabe fazer massagem nos pés, porque dirige bem, porque com ele as horas passam rápido demais, porque ele gosta dos animais, porque adora seus amigos ou porque ele atende o telefone no primeiro toque quando você liga. Há uma lista infinita de motivos para amá-lo, mas não há garantia nenhuma de que vai ser tudo lindo todos os dias e muito menos de que vai ser para sempre. Então, um dia, tudo isso acaba. E o preço que se paga por acreditar em contos de fadas é altíssimo. Quilos a mais, quilos a menos, potes de sorvete, garrafas de vinho e muitas caixas de lenço. Isso quando não há os assombros de vingança ou homicídio qualificado.

 

Somos descapitalizados todos os dias e a todo momento. Ainda bem que, se fizermos direito, o saldo acaba positivo, apesar de tudo. Os amigos, as histórias, a família, os amores, o trabalho. Não dá para desistir. Depois da ressaca terminada, sempre haverá outra festa. 


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