Eterna Aprendiz - Jornal Fato
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Eterna Aprendiz


Não sei exatamente em que altura da vida começou a minha relação com a leitura e a escrita. Sei, com certeza, que a escrita me liberta de amarras e convenções e me permite ser apenas uma mulher simples, apaixonada pelos livros, mas que nunca imaginou que seus textos, frutos de observações cotidianas e despretensiosas, pudessem ser literatura.

 

Fatos simples que talvez passem despercebidos à maioria, ou sejam considerados desimportantes, me fascinam ou indignam na mesma proporção. Talvez seja essa sensibilidade que mova a pessoa tímida, mas de olhar involuntariamente atento, que se expressa melhor através da escrita do que da fala. A oratória, definitivamente, está a quilômetros luz das minhas habilidades. Falar em público me consome, tira da zona de conforto e provoca calafrios. Dez a zero para a timidez.

 

Uma timidez tão crônica que limita a minha convivência com pessoas diferentes do meu restrito ciclo de amizade, embora transite com relativa segurança em todos os ambientes, por exigência profissional. Mas nas festas estarei cercada sempre dos mesmos e queridos velhos amigos. A interação com os outros que conheço apenas de nome é um pouco difícil, mesmo que ensaie as palavras de apresentação antes de sair de casa. Gostaria muito, mas é mais forte do que eu.

 

E com essa característica inimaginada numa profissional da imprensa, vou me aventurando em meus textos, sem a pretensão de torná-los livros. A possibilidade de publicá-los e a obrigação de ter uma noite de autógrafos me assusta tanto quanto as conduções coercitivas que se tornaram rotina, arbitrariamente, país afora.

 

Claro que o feed back dos leitores encoraja. "Você escreveu exatamente o que gostaria de dizer, mas não tive coragem", "Sabe que aquele seu texto me levou a refletir? Preciso me importar mais", "Seu texto é leve e a leitura flui. Não perco um", "Vim te agradecer. Você não sabe, mas aquele seu texto foi para mim". A cara queima e eu, que não tive o sonho de infância de me tornar escritora, vejo que a simplicidade também encontra eco no coração das pessoas. Ainda bem.

 

Porque é exatamente isso que pretendo quando escrevo. Que a simplicidade seja a palavra de ordem. Nada rebuscado nem digno dos grandes autores, porque sou uma eterna aprendiz que se aventura a partir da percepção do que não é dito, das entrelinhas e dos olhares, mesmo que fugidios, que revelam mais do que supõe a vã filosofia.

 

Mas preciso admitir uma coisa. Essa vida aparentemente modesta e sem graça, discreta e sem glamour, é fruto da opção de levar na caminhada apenas o essencial. Aquilo que seja agradável o suficiente para dar leveza à alma e cor à vida. Sozinha ou acompanhada, que seja intenso e belo.

 

Então a aparente reclusão não é falta de opção. É uma escolha que fiz por convicção, sabendo do preço a ser pago. Quero estar cercada de amigos que me acompanham pelo menos nos últimos 20 anos, que me arrancam gostosas gargalhadas e me fazem esquecer que logo ali, do lado de fora, os problemas esperam, muitas vezes numa longa fila, que parece sem fim.

 

Gostaria de citá-los nominalmente. Temos uma longa caminhada juntos. Rimos e choramos muitas vezes. E em todas elas, fomos envolvidos por amor, respeito e cumplicidade. A dor de um é a dor de todos. O mesmo acontece com as alegrias e conquistas. E se isso passou despercebido à maioria das pessoas, deixou marcas profundas e eternas em nossos corações. Um brinde à amizade. Tim tim.


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