Epitáfio - Jornal Fato
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Epitáfio


Tenho visto que os sujeitos têm se nivelado por baixo; comido o que tem sobrado das mesas e sem nenhuma cara de poucos amigos têm deixado os corpos, leves, serem conduzidos pelas marés. É gente conformada demais ou acertando na máscara para conviver com os efeitos nocivos, os gostos amargos e gente maquiavélica e chata.

 

Nunca estivemos tão sem cor, traçando os quadros com rabiscos ao invés de bonitos contornos. Estamos, cotidianamente, anunciando o que vendem os jornais, acatando os graves impostos, a mão sobressaltada e entregando tudo para os bandidos. Talvez, levantar da cadeira dói demais e abusar do discurso exige enfrentamento e milhares de doses de coragem.

 

Pergunto: "o que será de nós?" De que adianta tanta "ordem e progresso", se, sei que concordará, estamos em baita desordem e nenhuma forma de progresso? Mas, parece que abaixamos o corpo e nos deixamos apanhar. As sujeiras já escorreram há muito pelo tapete, sala, escritórios, tribunais, etc. O cheiro de moribundo já ganhou casas, igrejas e ministérios, palácios, etc. E aonde encontraremos material de limpeza suficiente e mão de obra para que o serviço seja feito?

 

Tais reflexões me esmagam todos os dias e, embora necessite de uma resposta, não vislumbro, com eficiência, uma saída urgente e real. São covardias, mentiras, maldades e canalhices demais. As inverdades propagadas entre sangues e falácias, entre sorrisos amarelos e insanidades, entre paletós e tolerâncias. Cansei da boa educação, da ideia de que tudo voltará à normalidade, à organização. Claro, uma normalidade e planejamento inventados para que o poder podre seja assegurado e as ideologias vigorem. A manutenção de uma ordem que só causa efeito danoso, uma doença que não se consegue tratar.

 

Estou enfadada dessas doenças de caráter, das ciladas enraizadas e das perspectivas medíocres canalizadas em nós. Bastam as falcatruas justificadas e mentiras redesenhadas como tentativa de não esmorecer. Grito para que o mal saia das entranhas e das camadas mais profundas da pele, que escorra dos esgotos fétidos, que exploda dos buracos, que se esvaia dos cenários sociais, políticos e econômicos.

 

Cansada das babaquices vendidas nos comércios das falsas moralidades, das sentenças criadas para que poucos consigam se esquivar do frio e tenham conforto e lugar quentinho. Estamos necrosados, com tendência a perdas de membros, com tendência a medicamentos controlados para que consigamos dormir e acordar. Verdadeiramente, sinto que estamos estancando.     

 

Simone Lacerda é professora. cheirosensaiosepoesia.blogspot.com.br


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