Dois Dias Antes do Desespero - Jornal Fato
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Dois Dias Antes do Desespero


Você disse que ia trabalhar. Passei em frente à casa de festas e não tinha nada. O que você esqueceu é que durante todo esse tempo eu criei uma rede de informações: entre seus amigos, no seu trabalho e nos lugares que você frequenta.  E o que você nunca soube é que comprei um revólver, embora sem saber se o motivo era me defender, te matar ou me matar.

 

Não foi difícil te encontrar. Eventos com mulheres seminuas são bem a sua cara, como é a sua cara aquela desclassificada oxigenada que mais parecia saída de uma daquelas bandas de música do Pará.

 

Hesitação foi coisa que passou longe quando vi vocês atracados dançando aquela música horrorosa. Soquei a cara dela, e acho que nem causei tanto estrago. Pior do que era com certeza não ficou. O nariz quebrado deve até ter conferido certo charme. Garanto que, em alguns dias, ela até manda flores agradecendo.

 

Quanto a você, sei que não te aguento no braço. Já me deu diversas provas de sua força física superior. Já me deu nocaute tantas e tantas vezes que já perdi a conta. Mas eu estava prevenida, e era o meu momento. Peguei a arma vacilante, porque não sabia exatamente o que fazer. Queria te machucar sem te perder. Um castigo, como a mãe que por amor corrige o filho. Desnorteada, atirei para cima, em você e, por fim, mirei em mim, mas fui impedida por alguém que me levou dali.

 

Não sei como agora estou em casa, deitada na cama que é nossa, embora, por muitas vezes, eu tenha chorado nela sozinha. Sozinha como agora e como todas as vezes em que eu mais precisei que estivesse ao meu lado.

 

Ouço o barulho da porta se abrindo e minha felicidade dura por alguns segundos. Só consigo lembrar-me da sua mão fechada na direção do meu rosto. Desmaio. E esse é, por incrível que pareça, o momento onde sinto mais paz, desde que te conheci. Até que eu retome meus sentidos, estar desprovida de todos eles permite que eu descanse enfim.


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