Ana e o Poeta - Jornal Fato
Colunistas

Ana e o Poeta


Ah! O meu poeta!

 

Tenho vivido dias intensos. E noites mais intensas ainda. Aprendi que se eu sussurrar uma sacanagem qualquer no ouvido dele, dessas que os autores que ele gosta não dizem, tudo fica ainda melhor. Ele aprendeu que se começa a me beijar pelas mãos, viro gueixa, e faço qualquer coisa que ele desejar. Aprendi que ele gosta de mordidas. Ele aprendeu a me colocar de cabeça para baixo. Aprendi que o sexo não precisa ser antes ou durante uma refeição, e sim a qualquer tempo, até durante. Ele aprendeu que se passar a barba mal feita na minha nuca um arrepio frenético me percorre até a alma.

 

Aprendemos juntos. Ainda há segredos para desvendar e muito caminho para ser percorrido. Mas sou ótima em ensinar, e melhor ainda em aprender. Não dá para ficar fazendo joguinhos. Eu te disse que tinha pressa. Lembra? Perdi muito tempo com você, e, no final de todos os dias que passamos juntos, eu estive exausta de tudo. Agora não. Agora tenho o corpo exausto, mas a alma leve. Leve como a de quem flutua, como a de quem não apanha mais, como a de quem não tem tempo a perder vigiando a vida do outro, já que a própria anda tão interessante.

 

Meu poeta me fez musa inspiradora, manda flores, leva café da manhã na cama. Meu poeta me empresta livros, me inspira com trilhas sonoras intermináveis e perfeitas, passa os dedos entre minha orelha e meu pescoço e me beija sempre com o desejo da primeira vez e a urgência da última.

 

E eu quase, quase esqueço que você existe. Mas você ainda está um pouco ali, como aquela ferida que a gente futuca e cai a casquinha, e sangra de novo, e coça, e incomoda mas não dói tanto. Você fica agarrado, como uma espécie de desenho em mim. Só espero que esse desenho seja carimbo, não tatuagem.

 

Mais duas ou três viagens na cama, sofá ou escrivaninha do meu poeta e te esqueço de vez. Vou te expulsando a medida que ele entra, até que seja definitivo. Ele em mim sozinho. E você fora, para sempre.

 

Enquanto isso não acontece, vou tomar meio rivotril e uma taça de vinho. Ninguém é de ferro. E até as pequenas feridas merecem um tratamento adequado.


Comentários