Outrossim

04/02/2016 00:00

 

Tantas notícias relacionadas ao mundo jurídico, trechos de sentenças e denúncias formuladas por advogados e procuradores às vezes nos deixam sem entender o que realmente ocorreu, qual o sentido das alegações utilizadas no caso. Volta e meia tenho que recorrer a um amigo advogado para me explicar se o que está escrito ali significa, afinal, um sim ou um não.

 

Quando entrei na faculdade de Direito, já era há muito formada em Jornalismo, que nos ensina a tentar sempre a simplicidade, a clareza e a objetividade na comunicação. Certa vez, ao corrigir minha primeira prova do ano, um professor comentou que eu tinha vocação para a imprensa: ?Você responde às questões como quem escreve uma matéria de jornal?, observou. Disse a ele que era essa a minha profissão e lhe perguntei se o texto jornalístico era um problema no Direito. Ele respondeu: ?Pode ser. Poucos juízes estão acostumados a textos que não precisam ser decifrados. Quanto mais difícil a compreensão, maior a aparência de competência nos tribunais?, ele lamentou. 

 

Não tive que me adaptar, porque acabei nunca advogando.  E confesso que, apesar da dificuldade de decodificar a mensagem, o que, segundo os críticos, pode prejudicar a transparência e o controle da Justiça, vejo uma certa beleza na linguagem jurídica. Há palavras e expressões maravilhosas no Direito - o Código Civil, em especial, é uma abundância, uma coisa linda de conceitos e significados.

 

Enfim, admiro a diversidade, até mesmo a linguística. E, se não domino o juridiquês, posso pelo menos me arriscar de vez em quando na linguagem da correspondência oficial, que me permite utilizar termos como, por exemplo, o advérbio ?outrossim?. Aliás, reza a lenda que, certa vez, ao encontrar um ?outrossim? na matéria de um jovem repórter, o escritor e então revisor do jornal Graciliano Ramos, conhecido por seu mau-humor , grosseria e desbocamento,  chamou o foca a sua mesa e mandou, em alto e bom som: ?Fulano, outrossim é a puta-que-o-pariu!?.

 

Pois eu sempre gostei de ?outrossim? e, se não posso usá-lo no jornalismo, por que não aproveitar alegremente a oportunidade que o maçante mundo dos ofícios me oferece? Afinal, é justamente quando tudo nos parece contrariedade ou tédio que não devemos mesmo desperdiçar qualquer chance de diversão.