Pai do alpinista Fabrício Amaral encontra conforto no espiritismo - Jornal Fato
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Pai do alpinista Fabrício Amaral encontra conforto no espiritismo

É na doutrina que Fernando Gomes de Souza, de 71 anos, pai de Fabrício Amaral, encontra conforto


Foto: Divulgação

O espiritismo é uma doutrina consoladora para muitas pessoas. Para quem é da religião, a vida continua após a morte física, por meio da reencarnação. É na doutrina que Fernando Gomes de Souza, de 71 anos, pai de Fabrício Amaral, encontra conforto.

Fernando tem três filhos vivos: Fernando Júnior, Luciana e Fernanda, e um outro que faleceu bebê, aos quatro anos de idade, o Luciano, que era irmão gêmeo do Fabrício, o alpinista cachoeirense recentemente morto.


Primeira parte da entrevista 


Fabrício e o amigo, Leandro Lanotta, conhecido como Mr. Bean, morreram ao tentar subir o monte Fitz Roy, montanha da Patagônia Argentina, em janeiro.

Vítima de duas tragédias familiares, uma acontecida há 38 anos e outra há pouco mais de um mês, ele tem uma maneira muito peculiar de lidar com fatos tão adversos.

A respeito do passamento do filho Luciano, ainda criança, Fernando, que não acredita na morte da forma convencional e chama a esse processo de desencarnação, ou seja, que a morte é apenas o desligamento do espírito do corpo material, é categórico: "Ele ainda está vivo, porque a alma é eterna, o que perece é apenas o corpo físico, que é um instrumento maravilhoso que nos é dado com a finalidade de evoluir", comenta.

Sobre a morte de Fabrício, ele diz que, naturalmente, a família ficou em choque, porque ele já escalava o Fitz Roy pela quarta vez. "Dessa vez ele queria chegar ao cume. Nas outras vezes, ele encontrou obstáculos e precisou abortar a missão".


Segunda parte da entrevista


O pai conta que o alpinista sempre deixava a programação com a família, com data de subida e descida dos picos que escalava. "Fabrício deixou tudo pronto. É como você dizer que vai a tal lugar e retorna em tal horário. Então, ele disse, vou subir o monte dia 16 e dia 22 estou de volta. Mas ele não desceu, e aí começou uma nova página na história de nossas vidas".

Aos amigos de Fabrício, Fernando pede para que não se preocupem, ou se entristeçam, só pensem nele como o amigo que ele sempre foi, guerreiro, valoroso, espírito de brilho. "Ele só deixou marcas de um cara corajoso, um verdadeiro amigo. Continuem pensando positivo, porque nós não fomos criados para ficar diretamente ou internamente no corpo físico. Fomos criados para mudar de 'uniforme' de vez em quando, como acontece na vida espiritual e encarnações", fala.

Fernando cita uma pergunta do Livro dos Espíritos, de Allan Kardec sobre o objetivo da encarnação dos espíritos. A resposta, ele diz, é enfática, direta e tira qualquer dúvida de um Deus não misericordioso, vingativo, muito visto na época de Moisés. "Deus lhes impõe a encarnação com o fim de fazê-los chegar à perfeição. Para uns é expiação, para uns, missão. A encarnação também tem outro fim, o de pôr o espírito em condições de suportar a parte que toca o ser humano na obra da criação".

"Então, podemos entender Jesus falando para nós que somos semideuses, podemos fazer muito mais nessa vida. Se somos semideuses, somos filhos de um pai. Nossa obrigação é ajudar na reconstrução do universo. E essa reconstrução do universo não é exterior, é sempre interior. Porque eu só verei um mundo melhor, se eu melhorar".

 

Sobre Fabrício

Fabrício era professor de Educação Física e trabalhava no Instituto Federal do Espírito Santo (Ifes). Lecionava em Venda Nova e tinha sido transferido para Cariacica. Era natural de Cachoeiro de Itapemirim e praticava alpinismo há 20 anos. De acordo com o pai, era considerado um dos melhores alpinistas do Brasil.

 

A escalada

O Monte Fitz Roy fica entre a Argentina e o Chile. Segundo Fernando, são duas montanhas de difícil acesso e o sonho de todo alpinista. Existe a temporada de escalada, de dezembro a janeiro, onde a maioria dos profissionais sobe. "Ele é comparado ao Monte Everest, sendo este um pouco maior, mas oferece menos perigo. O Fitz Roy tem muitos obstáculos, e, normalmente, nessa época de temporada, ocorrem muitos fenômenos naturais como tempestades, frio exacerbado, ventania, e que duram dias e semanas. Nessa última subida deles, a tempestade de 140 km/h demorou mais do que o esperado".

Fabrício não viajou com Leandro. Eles se encontraram lá, após dois alpinistas que subiriam com Fabrício, desistirem da escalada. "Fabrício soube que Leandro, que também era um excelente alpinista, estava na região e entrou em contato com ele. Topou e subiram. Eles não tinham combinado de escalarem juntos. Não foi por acaso esse encontro, porque o acaso é criação do homem", menciona.

Os dois não desceram na data, conforme constava no cronograma. Então, os alpinistas que estavam na região começaram a se preocupar. "O Beto, que é amigo do Fabrício, escalador também, começou a imaginar que algo tinha acontecido. Juntou com a equipe de resgate e começaram a procurar. Do ponto base ao início dessa montanha são 12 a 15 quilômetros de empecilhos. Saíram à noite para chegar de manhã".

No meio do trajeto, um dos socorristas caiu de uma altura de 30 metros e quebrou costelas. O grupo teve que abandonar a procura e retornar com o ferido. Nesse tempo, o vento não parou e a diretora do parque suspendeu toda a busca para não colocar mais pessoas em risco. Nem mesmo helicópteros poderiam subir.

"Ficaram aguardando esses dias, para o tempo melhorar, e aí o Beto resolveu reunir um novo grupo e voltaram às buscas e encontraram os corpos".

 

Decisão de deixar o corpo

Fernando explica que a família do Mr. Bean faz uma campanha para retirar o corpo da montanha. Mas, o cadáver de Fabrício permanecerá no local. "Essa era a vontade dele. Antes de ir, ele deixou claro que se acontecesse alguma coisa, não deveríamos nos preocupar com remoção do corpo, era para deixar lá. Ele era bastante evangelizado, e dizia que seria só o corpo e que ele estaria em outro lugar, em espírito".

É isso que conforma o pai. Saber que a vida continua e "que estamos sempre em construção".

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