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Vez por outra, com frequência cada vez mais regular, me flagro presa a reminiscências


Vez por outra, com frequência cada vez mais regular, me flagro presa a reminiscências. Daquelas que evocam cheiros, cores, pessoas, fatos, lugares, afetos e desafetos, sem a obrigação de externar felicidade e sucesso inexistentes, tão valorizados nas redes sociais.

O bom das memórias é isso. Dá para reconhecer os erros e admitir os fracassos e enxergar, enfim, com ou sem amarguras, a mudança de percurso, muitas vezes à nossa revelia, por pura negligência ou ingenuidade, típicas do jovem que acha que o mundo vai se dobrar aos seus sonhos e encantos e facilitar a sua vida.

Mas dá para perceber também o quanto acertamos e o que faríamos de novo, com um ou outro toque de excelência, graças à experiência adquirida ao longo do caminho e a maturidade conquistada, muitas vezes a duras penas. Aprendemos ao longo da caminhada, sem culpa ou dor, a ver a vida com outros olhos e de um novo ângulo.

Como diria Cazuza, "o tempo não para". E se é para avançar, não vale repetir os erros do passado. As lembranças precisam nos fortalecer, ressignificar, impulsionar e nos ensinar a tomar novos rumos a qualquer tempo, já que aprender é lição preciosa e merece lugar de destaque na galeria da vida.

Glamourosas ou não, o bom das reminiscências é que são para consumo interno e podemos lamentá-las ou festejá-las, sem plateia que as aplauda ou condene (muitas vezes somos nossos maiores algozes). Parece simples, e de fato é. Dizem os mais bem humorados que quem vive de passado é museu.

Então, as memórias devem nos fazer seguir em frente e avante. Nada de chorar sobre o leite derramado, que a vida é curta e merece ser intensamente vivida. Da minha parte, acho que as lembranças devem provocar saudades e reflexões. O que foi ruim deve ir para o baú do esquecimento, sem mágoas nem dores além das provocadas no passado. O que vale a pena são de fato as vivências do presente.

Do passado, vale a pena recordar o cheirinho gostoso das filhas ainda bebês, da dama da noite e da profusão de cores e formas das inúmeras flores do jardim, do bolo gostoso da avó, dos aromas que remetem a afetos e alegrias, dos toques de carinho que provocaram arrepios e das lágrimas de alegria por motivos mil, de relevância tal que se tornaram inesquecíveis.

Cada vez mais acredito que são os afetos que nos movem e fazem a vida valer a pena. Fazem renascer, a cada manhã, o brilho intenso no olhar. E é por isso que creio que o presente deva produzir outras histórias, para que novas reminiscências, repletas de significado e esperança, se consolidem todos os dias. Afinal, "felicidade se acha é em horinhas de descuido".

 


Anete Lacerda Jornalista

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