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Natureza humana

Silvio encontrava-se sozinho. Não se sentia solitário. Gostava da solidão. Momentos que organizava pensamentos


Silvio encontrava-se sozinho. Não se sentia solitário. Gostava da solidão. Momentos que organizava pensamentos. Coisas vividas e as que estavam por viver. Momentos passados e presentes. Momentos do seu futuro. Instantes alegres e tristes nas muitas lembranças. Das lembranças: algumas se apagavam em breves flashes; outras permaneciam marcantes em sua mente e evidenciadas à flor da pele. De repente esqueceu-se dos pensamentos, passou a observar a cidade à sua frente. O sol projetava-se sobre a varanda do apartamento. Do alto do morro observava os transeuntes e o céu claro. Admirava a ausência de nuvens no céu. Os raios solares cobriam seu corpo, o suor escorria pelo tronco. Sentia-se bem, a luminosidade daquela manhã o surpreendia. Na véspera, no fim de tarde do sábado, enquanto caminhava à beira do rio, o escurecimento repentino, com o término do dia precoce e instantâneo, também o surpreendera.

A natureza mostrava sua face, pensou Silvio. Na verdade não era a natureza diferente, era ele. Nos últimos meses, desde o sumiço da Márcia, observava melhor os detalhes do dia, da noite... Detalhes do entorno da sua vida. Surpreendia-se com o que via. Procurava explicações para as coisas da vida amorosa. Não obtinha respostas. Permanecia na ignorância. Uma busca inútil, concluía. Os fatos e coisas da paixão, apenas acontecem. Não se explicam ou justificam. Na maioria das vezes deixamos acontecer: início e fim.

Permanecia na sacada do apartamento. Teimosamente. Não se importava com a intensidade do sol. Desejava o calor que ele oferecia. Sentia-se agraciado. Algo novo, o sentimento pelas coisas da natureza, nunca valorizara. Pensou em Márcia. Onde estaria? O que fazia? Pensava nele? Não aguardou o fim dos seus pensamentos e as conclusões do raciocínio. Sofreria uma dor desnecessária. Melhor não pensar. Seriam lembranças doloridas. Uma saudade dolorida. Não pensar, não lembrar, era sua melhor defesa. Esquecer era a melhor forma para sobreviver ao fim da paixão amorosa.

O pensamento insistia em retornar. Retornava após uma breve pausa. No vazio dos instantes, buscava justificativas para o desaparecimento da Márcia. Perguntava-se: quantas paixões amorosas podemos viver na vida adulta? Respondia para si e de pronto: uma. Todas as outras sensações amorosas careciam da paixão, acreditava. Sentia pena daquele que nunca se aventurou nos riscos de uma paixão. Aquele que nunca sentiu a dor que ele sentia. Que nunca passou pelo desatino da mente adoecida pelo amor. Quem nunca sentiu esse desejo, nunca viveu a verdadeira experiência humana, concluiu.

Ele se surpreendia com os pensamentos. Com o turbilhão de ideias e desatinos que se apoderava da sua mente. Porém, não eram suficientes para esquecer Márcia. Pelo contrário, mesmo não querendo, crescia a vontade de revê-la. Mesmo sabendo que assim como aparece, a paixão desaparece, sem deixar vestígios. Os impulsos gradativamente cedem à razão. Uma dupla via: desejo e razão. Lembrou a primeira vez que encontrou Márcia. Desde o primeiro instante, no primeiro olhar, buscou a chama da paixão. A natureza humana se assemelha às forças da Terra. Naquele instante, desejou retornar ao pó da Terra. Ao inicio e fim de tudo.

 

Sergio Damião Santana Morares

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Sergio Damião Médico e cronista

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