Direitos humanos: política de Estado - Jornal Fato
Política

Direitos humanos: política de Estado

Nova secretaria prioriza políticas públicas para jovens, mulheres e planeja um fundo voltado para o idoso


 

Crédito: Beto Morais/Secom-ES

O professor de ética, Júlio Pompeu, acaba de tomar posse como secretário de Estado de Direitos Humanos. A lei complementar que criou a Secretaria de Estado de Direitos Humanos (SEDH) foi sancionada pelo governador Paulo Hartung no começo de julho. O novo secretário foi empossado na semana passada. Vale lembrar que anteriormente Júlio já era responsável pela coordenadoria de direitos humanos que fazia parte da vice-governadoria. Agora, com uma pasta separada, o novo secretário espera unificar e fortalecer as políticas de direitos humanos que já estavam sendo desenvolvidas pelo Governo do Estado.

Em entrevista exclusiva concedida à Associação dos Diários do Interior do Espírito Santo, Júlio Pompeu fala das prioridades da secretaria. A violência contra mulher e contra os jovens são temáticas centrais, bem como a participação em todas as ações sociais implementadas pelas demais pastas. O novo secretário defende o diálogo permanente com os movimentos sociais eexplica a proposta de Projeto de Lei que pretende criar um fundo de política para pessoa idosa. Júlio conta ainda que existe previsão de que centros de referência no atendimento aos mais diversos tipos de violência contra as mulheres cheguem ao interior do Estado no próximo ano.

Leia entrevista completa:

 

O senhor pode explicar o que são direitos humanos?

Materialmente, quais são os diretos humanos? O direito a vida, dignidade, propriedade. Eu resumiria como o direitode viver em sociedade honestamente, sendo respeitado e respeitando. Quando você aluga um apartamento, por exemplo, você tem o direito de morar ali. O proprietário tem obrigação de deixar você morar ali, desde que pague. Um direito, uma obrigação. Quando se coloca a palavra "humanos" do lado de"direitos", você diz que o dono desse direto é todo mundo!

 

O Governo do Estado, nos últimos dois anos, não criou novos aparelhos administrativos do porte de um secretariado. Sei que a Secretaria de Direitos Humanos (SEDH) foi criada com remanejamento de cargos e orçamento, não havendo acréscimo de despesas ao Executivo. Mas, o que motivou essa iniciativa e qual a missão da secretaria?

Todo esforço fiscal do Estado não é a contenção pela contenção. É uma economia para ter capacidade financeira e de implementar politicas sociais com recursos próprios. A secretaria nasceu para ser mais um aparelho de incremento dessas políticas sociais. Junto com Escola Viva, Ocupação Social, por exemplo. É uma secretaria que permite unificar as ações de proteção, promoção e defesa dos direitos humanos, fazendo coro junto com o conjunto de ações estruturantes do Estado nesse campo social.

 

 "Fazemos uma política pública voltada para quem mais precisa"

 

 

Qual o orçamento previsto para as ações da secretaria e como ela dialoga com as demais pastas?

Viemos reforçar a importância desse viés dos direitos humanos. Do respeito às pessoas, as vítimas de crime. Direitos Humanos ganhou status de política de primeira linha, isso facilita um diálogo que já vinha ocorrendo. Não dá mais para pensar uma gestão pública dividida em caixinhas, em que a educação é problema só do Secretário de Educação, segurança do Secretário de Segurança. Educação, segurança, cultura, esporte são exemplos de políticas de governo que requerem um trabalho de equipe. Fazemos uma política pública voltada para quem mais precisa.

 

O Palácio Anchieta, sede do Governo do Estado, foi ocupado por cerca de 400 manifestantes no começo de março. Coube ao senhor conduzir o processo de diálogo com os movimentos sociais. Em situações como essa o senhor será a pessoas que irá dialogar com os movimentos sociais?

Uma das missões da secretaria é ser um canal permanente de diálogo com os vários grupos sociais. Temos grupos formados por pessoas muito diferentes com reinvindicações distintas. A delicada arte do diálogo em meio a tantas diferenças é o que cabe, entre outras funções, a essa secretaria. E não é ouvir por ouvir. O objetivo é ser um canal que torne viáveis as demandas que são razoáveis, licitas e fazem sentido sob a ótica de uma política social vinda desses vários organismos da sociedade.

 

E esse diálogo permanente com os movimentos sociais tem sido feito, essa interlocução ganha nova sistemática daqui para frente?

Essa prática se intensificou. A secretaria dá mais visibilidade. São muitos grupos e nem todos ainda descobriram que existe esse canal e que é simples nos comunicarmos. Não há dificuldade de falar com o secretário e tem que ser assim. O Estado não pode ser algo encastelado, com meia dúzia de burocratas em cima de planilha pensando a vida das pessoas. As pessoas tem que vir falar de suas vidas e problemas, até para enriquecer o planejamento das ações públicas.

 

Temos problemas relacionados aos direitos humanos no Estado. A questão da violência contra mulher, tráfico de pessoas, trabalho em condições análogas de escravidão... Existe algum ponto que seria nosso grande calo e será atacado em primeiro lugar pela ação da secretaria?

Dos grupos sociais específicos demandam atenção prioritária nossa: a violência contra mulher e contra os jovens, moradores de áreas com condições sociais muito baixas que estão sendo mapeados pelo programa Ocupação Social. E não podemos resolver esses temas fazendo mais do mesmo. Por exemplo, a violência contra mulher tem singularidades, muitas vezes a vítima mora com o agressor. Ela precisa ter condições econômicas, morais e psíquicas de sair da condição de vítima e se livrar daquilo. Precisamos de uma rede social de suporte que permita a saída dessa situação, trabalhamos nesse reforço.

 

Dois espaços de referência no atendimento aos mais diversos tipos de violência contra as mulheres tinham inauguração prevista para 2014, mas ainda não foram efetivadas. Porque o Centro Integrado Centro Especializado de Atendimento e a Casa da Mulher Brasileira (ambas em Vitória) não estão funcionando?

Estamos tentando colocar quatro casas dessas no interior: duas no Sul, duas no Norte. A Casa da Mulher Brasileira é um programa do Governo Federal na Grande Vitória. Nesse caso o nó é federal, falta de recursos em Brasília. Estamos tentando junto a União a resolução para termos aqui esse importante aparelho. O outro centro de referência foi planejado para funcionar do lado. Não precisamos dos dois aparelhos um ao lado do outro, temos que jogar para o interior. O problema de violência não atinge só a Região Metropolitana.

 

Esses centros de referência no interior já tem prazo para ser implantados?

Pretendemos que, em 2017, os primeiros já estejam funcionando. Essa é nossa meta. Inclusive isso está no nosso Planejamento Estratégico como ação prioritária.

 

Com uma população carcerária em torno de 19 mil internos, o Espírito Santo é apontado como referência nacional no sistema prisional. É possível afirmar que os direitos humanos são respeitados dentro dos presídios capixabas?

A estrutura física é a melhor do país, sem dúvida. Mas, além disso, existe o esforço do Governo, que gerou práticas dentro das unidades que são de outro nível. Melhoramos muito. Nosso dever, para manter isso funcionando bem, é não permitir que eventuais desvios de conduta passem impunes. Temos que orientar e dar condições dignas para que os agentes penitenciários trabalhem conforme a lei, esse é o nosso esforço.

 

A secretaria de Direitos Humanos estuda sugerir alguma iniciativa legal, via Assembleia Legislativa, que possa resguardar os direitos humanos no Espírito Santo?

Estamos com o projeto de implementar um fundo de política para pessoa idosa, que é alimentado com recursos vindos de decisões judiciais. Isso permite ter poder de fogo para realizarpolíticas públicas para os idosos. Temos outros grupos que também são prioritários, como as mulheres negras e as jovens,que sofrem mais com a violência. A maior parte dos estupros atinge jovens entre 10 e 16 anos. A gente chama de violência contra mulher, mas é contra criança!Obter recursos para efetivar políticas públicas focadas nesses grupos é o tipo de alteração legislativa em que nos concentramos. Também pretendemos sugerir mecanismos legais que inibam determinados tipos de violência. Trabalhamos numa proposta de Projeto de Lei que vede o financiamento de bancos públicos a empresas que tenham praticado ou se valido de trabalho escravo, tanto em sua ação direta, quanto na sua cadeia produtiva.

 

Currículo:

Júlio Pompeu tem graduação em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (1995), mestrado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (1999) e doutorado em Psicologia pela Universidade Federal do Espírito Santo. Atuou como professor de Ética e Teoria do Estado do Departamento de Direito da Ufes, lecionando disciplinas na graduação em Direito e nos programas de pós-graduação em Direito Processual e no Mestrado Profissional em Gestão Pública.

 

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