Pessoas em situação de rua ocupam o Centro de Cachoeiro - Jornal Fato
Geral

Pessoas em situação de rua ocupam o Centro de Cachoeiro

Somente neste ano, a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social registrou 76 pessoas em situação de rua no município


Rafaela Thompson

A praça Jerônimo Monteiro, no Centro de Cachoeiro de Itapemirim, virou moradia para algumas pessoas em situação de rua. Os moradores que se abrigam no local chamam atenção da população. Na última semana, um varal de roupas estendido em plena tarde no meio praça impressionou quem passou pela região central da cidade.

Já na última quarta-feira (2), um novo varal, barracas e até mesmo uma fogueira foram improvisadas na Praça dos Taxistas.

Quem trabalha pelo Centro conta que às vezes o rendimento é prejudicado, já que muitos clientes evitam passar próximo aos moradores de rua, que abordam quem passa pelo local para pedir dinheiro.

"É uma situação bem chata. A gente fica com pena, mas eles acabam atrapalhando a gente. Tem um que sempre entra aqui na loja. Quando ele está aqui, os clientes sentem receio de entrar. E quando a gente pede ele para sair, começa a xingar. Os clientes acabam ficando com medo e a gente, também", comentou a gerente de uma loja de produtos naturais, em frente à Praça Jerônimo Monteiro, Patrícia Bastos.

"A cidade está abandonada. A prefeitura precisa tomar alguma providência. Eles entram aqui na minha loja nos intimidando e exigindo dinheiro. Tenho mantido a porta fechada e só abro quando há um cliente querendo entrar. É uma situação bem complicada", contou Flavia Mendonça, empresária do ramo de óticas.

Segundo a prefeitura, de janeiro a março deste ano, Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social registrou 76 pessoas em situação de rua em Cachoeiro de Itapemirim.

Amarelo, Independência, Guandu, Avenida Beira Rio, BNH, Gilberto Machado e mediações da Estação Ferroviária, mas principalmente, a região central da cidade, são as áreas de maior incidência de pessoas em situação de rua.

A prefeitura informou que as abordagens são realizadas semanalmente nestas regiões. Além disso, a equipe técnica faz mapeamento destas áreas e encaminham àqueles que são favoráveis ao atendimento para o Serviço de Atendimento à Pessoa em Situação de Rua, no Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas), localizado na Rua 25 de Março, 181, Centro.

 

Trabalho

O Serviço de Atendimento à Pessoa em Situação de Rua, além de realizar cadastramento, acompanhamento e orientações acerca da saúde, encaminha os cadastrados ao mercado de trabalho. Quando o morador pretende firmar moradia em Cachoeiro, é oferecido abrigo provisório até a retirada de toda documentação para que em seguida ele seja destinado à uma vaga de emprego.

O município também dispõe de convênio com o Serviço de Acolhimento para Adultos, Casa de Passagem "Madre Tereza de Calcutá". O encaminhamento é feito pela equipe técnica do Creas e o local fica na Rua Deodoro da Fonseca, nº 98 - Independência, rua do IML de Cachoeiro, com funcionamento 24h.

Nas primeiras abordagens, o morador pode negar o acolhimento. No entanto, a equipe permanece o acompanhando e insiste para fazê-lo mudar de ideia, na medida em que há construção de vínculo de confiança.

Sobre o caso dos ocupantes da Praça Jerônimo Monteiro e Praça dos Taxistas, a prefeitura informou que os moradores residem na cidade e já passam por acompanhamento, alguns já estiveram na Casa de Passagem. Uma nova abordagem seria feita nesta sexta-feira (4) na região.


 

Na rua há cinco anos, ele sobrevive da artel

 

Uberdam ores com fibra das folhas de coqueiro e palmeiras: "Eu aprendi muita coisa boa na rua"

 

Carlos Uberdam Raimundo da Silva, mora na rua há cinco anos. Diz que está nesta situação por falta de oportunidade. "Eu vivo da minha arte. Sou soldador, eletricista e professor de música. Infelizmente há um tempo me envolvi com drogas. Depois disso, não tive mais oportunidade de emprego", revela o artesão, que faz flores com fibra das folhas de coqueiro e palmeiras.

Uberdam tentou voltar para casa, mas não se adaptou. "Eu tentei voltar pra minha família, mas a rua já tinha me viciado".  Foi sem um teto sobre a cabeça que aprendeu a desenvolver a arte que hoje o sustenta. "Eu aprendi muita coisa boa na rua. Aprendi a fazer artesanato e tenho liberdade, me sinto livre aqui", disse.

Segundo Uberdam: "a gente tá aqui por que precisa estar. Queria que as pessoas nos olhassem com menos julgamento. Por que somos todos iguais".

 

"Não somos sujos"

 

Uberdam reclama que muitas vezes a prefeitura realiza trabalho "fajuto". "Eles [prefeitura] vêm aqui, e pedem pra gente sair, mas a gente vai pra onde? Pra outra cidade? Como? Se eu moro aqui? Eles vieram aqui e pediram pra gente sair até hoje (5). Mas não deram um lugar pra gente ir. No abrigo, podemos ficar até três dias. Na verdade, a gente queria um lugar fixo. A prefeitura quer tirar a gente do centro, por que quer uma cidade limpa, como se a gente fosse sujo. Não somos sujos".

O preconceito é uma realidade para quem viva ao relento. "Nem todo morador de rua é bandido, nem todos usam drogas. Tem muita gente que tá aqui hoje por falta de opção, falta de oportunidade", reforça.

"Eu não peço esmola, eu vendo minha arte. Tem muita gente de coração bom, que me ajuda sem eu pedir nada. Um vem aqui e traz uma marmita. Outro traz água, chinelo ou uma blusa de frio [...]. Tem muita gente boa mesmo. Agradeço a Deus pela vida delas, mas tem gente que olha com olhar de nojo, ou quando vou oferecer meu trabalho, fogem como se eu fosse roubar. Isso magoa a gente".

Comentários