Encontro de almas - Jornal Fato
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Encontro de almas


Desde o último quase encontro com Márcia, na verdade, um telefonema não completado por falta de coragem, Silvio encontrava-se angustiado e triste. Mostrava-se, em seu dia a dia, melancólico. Os colegas percebiam a tristeza no olhar, a falta de interesse por coisas que antes o faziam vibrar, coisas que lhe davam excitação ("tesão"), aquilo que os gregos chamavam de Eros - a força vital. A força e energia que nos faz vibrar e nos sentirmos vivos. Desejosos por um novo dia, mesmo com todas dificuldades e intempéries. O amor por Márcia, não realizado, causava em Silvio a doença da alma - amor romântico ou cortês, como denominavam os medievais.  A questão: como curar uma doença que nascia e crescia no mais profundo do ser. Sem modificações físicas aparentes. Nenhum sinal em pele, face, membros... Sem alterações em exames laboratoriais e de imagens corporal. Sem evidências físicas a serem identificadas pelo médico. Nada que o psicólogo pudesse agir. Uma doença causada pelo desejo e sofrimento. Vislumbrava duas opções: lutar por seu amor ou esquecer. Para vencer, precisava superar sua covardia. Para a cura daquela doença, se fosse preciso agiria como um verdadeiro canalha. Antes usaria as virtudes para enfrentar os desafios que ora se apresentavam. Decidido, buscou as ruas da cidade.

 

Tinha consciência do que enfrentaria. Até então vivia tranquilo, verdadeiramente em paz. Desde o primeiro encontro com Márcia, uma verdadeira agonia apossara-se da sua mente. Dias inquietantes, uma aflição, algo não desejado, por muitas vezes rejeitado, necessitava recuperar a paz que já não existia. No momento: a paz seria encontrá-la mesmo por alguns instantes. Vê-la ou falar-lhe já seria suficiente. Passara-se um dia desde a ligação da Márcia. Tentaria contato telefônico. Insistentemente, repetia o toque no telefone, quase automático. Nada. Nenhuma resposta. Apenas a triste mensagem do celular: ocupado ou desligado pelo cliente. Agiu como detetive, procurou um endereço pelo número da placa do carro. Obteve o endereço de trabalho da Márcia. Aguardou nas proximidades da empresa. Lembrava um serviço de informática. De repente Márcia surge ao longe, o vidro do carro aberto permite a identificação. Podia ver seu rosto, a pele branca da face contrastava com o escurecimento dos cabelos. Deixou-se ver e sorriu; ela correspondeu. Em seguida, repetiu a ligação. Insistiu uma, duas, na terceira ela atendeu. Alô... Ele não soube o que dizer. Balbuciou: meu amor... Ela: que saudade. Pronto. Ele sabia que deveria assumir riscos. Desejava aquele corpo.  Perderia sua alma, adoeceria mais e até morreria de amor.

 

Conversaram. Minutos, beirando a hora. Assuntos diversos. Normalmente não demoraria ao celular. Despediram-se quase noite. Nada marcaram. No dia seguinte, pela manhã, um novo telefonema, não respondido. Em final de tarde, encontrava-se no mesmo local do dia anterior, era uma quinta-feira. Retornou na sexta. E no sábado encontraram-se. Um encontro rápido. O bastante para o encontro de mãos e corpos. Um beijo. Bem junto ao carro. Um beijo quase roubado. No final do beijo, com os lábios livres, uma decepção, ela diz: acabou. Nunca mais. Não posso te encontrar. Era um fim de semana... Manhã de sábado, a solidão do domingo se anunciava.

 

Sergio Damião Santana Moraes

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