Café Campeão, a Homenagem - Jornal Fato
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Café Campeão, a Homenagem


 

Quando conheci José Guilherme Lima, dono do Café Campeão, em fins de 1973, não o conheci. Explico. Viera transferido de Itapemirim, para o Banco do Brasil de Cachoeiro. Logo fui apresentado a borderôs e contratos do Café Campeão, que já era cliente antigo do banco, eram seus papéis que estavam lá. O dono não aparecia na agência - e não comparecia porque não precisava - a empresa gozava, como goza, de crédito para desenvolvimento de seus negócios de torrefação de café. Aliás, para ter crédito, além da confiança que deve passar ao banco, o empresário precisa trabalhar e não se trabalha frequentando exageradamente bancos, exceto, claro, os bancários.

 

Ou seja, conheci José Guilherme não o conhecendo, tanto ele como outros empresários de alta qualidade, dos quais Cachoeiro é fonte; empresário que trabalha como mouro, não tem tempo de ir a banco. A nós, funcionários, só chegavam noticias do trabalho e da qualidade dos produtos do Café Campeão - e se estou me referindo a 1973 e a hoje, poderia retornar a 1941, quando, na Praça Jerônimo Monteiro, começava a saga do Café Campeão, então comandado pelo pai do José Guilherme.

 

Pois José Guilherme, ao menos em nossa região, acabou por inventar novidade espetacular - indústria de torrefação sem fumaça e sem chaminés. Segundo notícias que colhi, sou bom de colher notícias, o Café Campeão, à medida que crescia, jorrava pelas chaminés fumaça oleosa que incomodava cidade e cidadãos. Daí que a indústria se mudara da Praça Jerônimo Monteiro para os fundos da Rádio Cachoeiro, depois para próximo à Casa do Estudante. E a fumaça crescia, como crescia a indústria do Café Campeão.

 

Mudou-se a torrefação, finalmente, para bem longe (hoje é pertinho) e instalou-se em terreno de 100 mil m2, do qual ocupa pouco mais que 1.000 m2 de construção. Longe, em área pouco urbanizada, era a glória, podia soltar fumaça pelas chaminés à vontade, sem o menor problema - aqueles tempos simples permitiam.

 

Qual o quê? Um dia conheci de verdade o José Guilherme. Como funcionário do banco, fui visitar a indústria tão bem instalada em tão grande área verde e tomei um susto pra vida inteira, susto e entendimento de que para tudo tem jeito.

 

A indústria, bem grande, não tinha cheiro ou fumaça, não tinha... chaminé. Estranhei e perguntei, e José Guilherme respondeu, contanto a história do por que das várias mudanças de sede da empresa: - "Viemos para longe da área urbanizada, arrumamos um forno que engole fumaça, em vez de lançá-la pela chaminé, e não tem mais cheiro" - a fumaça volta para o forno em moto-perpétuo.

 

Aprendi duas coisas: quem faz bem, faz sem aparecer; e o meu café, Café Campeão do Mourads, não polui minha terra.

 

Therezinha Edwiges, Mais que Artesã

 

 

Em 16 de maio recebi este presente ai ao lado - belíssimo artesanato produzido por Therezinha Edwiges, com motivo da Casa de Roberto Carlos. No artesanato, veio grudado simpático bilhete assinado por ela, nestes termos: - "Dr. Higner Mansur, o senhor é grande defensor do artesanato de Cachoeiro de Itapemirim, somos muito gratos pela sua atenção".

Preciso desmentir Therezinha, professora dos tempos do Grupo Escolar Bernardino Monteiro e artesã de mãos cheias.

 

Sou mero divulgador do artesanato de Cachoeiro e do artesanato de modo geral. Grande artesã e grande divulgadora do artesanato de Cachoeiro é ela, Therezinha Edwiges, e eu é quem sou muito grato pela atenção dela (parte importante do que divulgo inicia-se com o entusiasmo de Therezinha que, como outras artesãs, estará na Bienal Rubem Braga (31 de maio a 5 de junho, no horário de 13 às 22 horas, na Praça de Fátima).

 

 

 

 

 

A Louca da Casa - A Imaginação

 

Rose Montero

 

"... a crítica ou a análise honesta das relações de poder faz parte do nosso ofício. Por isso, quando traímos a nós mesmos, quando nos curvamos, quando nos vendemos, somos duplamente notórios em nossas trapalhadas. E também porque todo poder precisa de arautos e porta-vozes; todo poder precisa de intelectuais que inventem para ele uma legitimidade histórica e um álibi moral. Esses, os intelectuais orgânicos, a meu ver são os piores. São os mandarins, e não se exerce impunemente este papel barrigudo de grande Buda. Mas os outros tampouco são puros. Aliás, desconfio dos puros: eles me apavoram. Dessa pureza fictícia nascem os linchadores, os inquisidores, os fanáticos. Não se pode ser puro sendo humano". (52)

 

"Às vezes a mesma pessoa pode apresentar comportamentos diferentes: pode ser heroico frente a alguns desafios e miserável em outros. O celebérrimo manifesto de Zola a favor do judeu Dreyfus sempre é citado como exemplo do compromisso social e moral do escritor, e sem dúvida Émile Zola precisou ter coragem para escrever seu iracundo EU ACUSO quase absolutamente sozinho contra os bens pensantes. Mas nunca se recorda que, três anos antes, esse mesmo Zola negou-se a assinar um manifesto de apoio a Oscar Wilde, condenado a dois anos de cadeia nas desumanas prisões vitorianas só por ser homossexual". (52)

 

"Quanto mais cedemos à vaidade (quanto mais nos picamos), mais precisamos". (99)

"Nos nossos melhores momentos, quando a insegurança não nos puxa demais o tapete, todos nos consideramos maravilhosos". (101)

 

"Descobri, não sem dor, que qualquer mentecapto era capaz de escrever, disse Kipling". (101)

 

"Não, o que não se pode falar é preciso imaginar, é preciso sonhar, e preciso alinhavar os contos substanciais com os quais contamos a nós mesmos. Desde o começo dos tempos, o mito foi a melhor maneira de combater o silêncio". (105)

 

"Temos uma estranha tendência a pensar que as pessoas que gostam do que escrevemos são mais inteligentes, enquanto aquelas que fazem reparos, vai ver que afinal não eram tão inteligentes como pareciam". (106)

 

"Para aprender a escrever é preciso ler muito... Deixar de escrever pode ser a loucura, o caos, o sofrimento; mas deixar de ler é a morte instantânea". (129)

 

(Rosa Montero, nascida em 1951, é jornalista espanhola de grande prestígio, o que se atesta pelos seus escritos, como estes que apresento. O título do seu livro, cujas frases transcrevo, é A LOUCA DA CASA, expressão que deriva da frase de Santa Teresa de Jesus: "A imaginação é a louca da casa". Os números após as frases são as páginas do livro de bolso. Recomendo muito).


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