Águas correntes           - Jornal Fato
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Águas correntes          


À beira do rio encachoeirado, chamado Itapemirim, verifica-se águas paradas, empoçadas, mas, vez ou outra, sua forma muda e, tristemente, vidas são levadas pelo engano da aparente mansidão que suas curvas revelam e que suas águas turvas ofuscam. O que parece sereno, vida e incapaz de fazer mal, tem seus trechos revoltos, suas armadilhas e seu lado sombrio que muitas histórias de vida, ao longo de sua existência, precocemente, encerrou.

 

As instabilidades do, às vezes belo e às vezes cruel, Rio Itapemirim se refletem na vida daquele que experimenta as intempéries do acaso, do destino, ou seja, do nome que se quiser dar.

 

Isso porque, como já dizia o imortal Machado de Assis, em sua obra Memórias Póstumas de Brás Cubas, "Vida é luta. Vida sem luta é um mar morto no centro do organismo do universo". Se viver é enfrentar constantes desafios e, se adentrar-se às águas do Itapemirim é se colocar, de modo não tão diverso da vida, à prova, nasce a certeza de que, tanto no curso das águas naturais quanto na vida, que diariamente desbravamos, enfrentamos águas correntes que nem sempre conseguimos controlar.

 

Assim, por vezes levamos a vida, mas vez ou outra é ela quem nos leva para o local onde devemos estar. Não que eu concorde com Zeca Pagodinho e ache que temos que deixar a vida nos levar, mas, gostando ou não, em muitas situações, ela nos leva e só nos cabe tentar manter o equilíbrio para suportar suas tormentas até que encontremos um porto seguro para encostar.

 

Nem sempre o porto seguro está por perto ou existe. Contudo, essa é uma das mágicas de viver: se as correntes são fortes, também temos a chance de nos fortalecer para o seu enfrentamento. Nem todos conseguem se manter nadando contra as correntes, alguns fraquejam, mas, ainda assim, podem gritar por socorro, pois, sempre é possível pedir ajuda e sempre há de existir boas almas que queiram socorrer um necessitado.

 

Com as águas correntes do ambiente natural, nem sempre os gritos resolvem e estes podem ser ofuscados pela falta de força ou de voz, enquanto sentimos o corpo desfalecer.

 

Na vida não é - ou não deveria ser - assim. Sempre há a chance de lutar ou, quando esta se revela impossível no momento, ainda se pode boiar para esperar a tormenta passar e, quando o equilíbrio da situação voltar a ser, ao menos de longe, enxergado, o coração aflito volta a bater, a cada dia mais, no seu tum tum normal, revelando que tudo na vida passa, pois não há corrente que siga um único fluxo cujo caminho não possa ser desviado.

 

Deste modo, enquanto às águas correntes direcionam nosso Itapemirim ao imenso mar, que essas mesmas águas amenizem nossas lutas e nos levem próximos aos nossos portos seguros.

 

 


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