Pela vida de todas as mulheres - Jornal Fato
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Pela vida de todas as mulheres

Nos dois primeiros meses de 2022 o número de agressões à mulheres que foram denunciadas à polícia já é maior do que o mesmo período do ano passado. Subiu de 284 para 295


- Foto Reprodução Web

Temos que lembrar da subnotificação, já que muitas mulheres, por motivos variados, entre eles dependência financeira, não denunciam e nem abandonam os agressores porque sabem que não têm condições de sustentar os filhos. E geralmente tiveram a autoestima tão destruída ao longo dos anos que já não enxergam a força e o potencial que carregam.

Só na região serrana do Estado, em janeiro e fevereiro, cinco casos foram denunciados. Em Santa Maria de Jetibá, essa semana, uma mulher foi agredida com golpes de facão. Ao gritar por socorro, as filhas, que moravam perto, tentaram socorrê-la. Uma, de 22 anos, também foi agredida e morreu. A outra, de 14 anos, também foi golpeada com o facão, mas sobreviveu.

Ela e a mãe continuam internadas e o assassino foi preso escondido numa mata mais de 24 horas depois. Sabe-se, a partir de depoimentos, que sempre foi violento e que as meninas não moravam na mesma casa em função da truculência do homem.

Mais: descobre-se que o homem ficou 14 anos presos por tentar matar o próprio pai. E depois por tráfico de drogas. Então boa gente nunca foi. A mulher certamente vinha sofrendo há muito tempo, mas mora na zona rural, onde ainda são arraigadas duas ideias bem antigas: "ruim com ele, pior sem ele", e "em briga de marido e mulher ninguém mete a colher".

Mete sim. A colher e até a pá, se for necessário. Caso contrário continuaremos vendo mulheres sendo humilhadas, agredidas e mortas com requintes de crueldade. É nessa hora que me dou conta do quanto é inglória a luta pela não violência à mulher. Enxugamos gelo o tempo todo. Porque não temos a Casa da Mulher Brasileira, idealizada no governo da presidente Dilma, que daria o suporte que essas mulheres precisam. Deveria ter em todas as cidades brasileiras. Mas defender a vida de todas as vítimas de violência doméstica para quê? Esse é um equipamento público caro, dizem ao justificar o corte de verbas.

Enquanto isso vemos dinheiro público indo pelo ralo em benefício próprio, os gastos sob segredo do cartão corporativo, os pagamentos de propina que dobram o valor das obras públicas, reduzindo a sua qualidade e tempo de vida útil para menos da metade. É de doer na alma que mulheres continuem sendo agredida sob as bênçãos do poder público. Quanto vale a vida de uma mulher? Realmente falta vontade política para uma solução eficiente e definitiva e ao que parece essa pergunta não entra de verdade no questionário e na lista de prioridades.

Mas vez ou outra surge uma luz no fim do túnel. Parece pouco, mas não é. Ao contrário, pode ser a diferença entre viver e morrer.

O STF decidiu nesta quarta-feira (23) que autoridades policiais podem retirar de casa potenciais agressores de mulheres para impedir que a violência doméstica se concretize. Dessa forma não é preciso mais aguardar a medida protetiva emitida pela justiça. O policial que atender a ocorrência pode fazer isso. A alteração na Lei Maria da Penha foi aprovada em 2019, mas houve discordância, agora pacificada pelo Superior Tribunal de Justiça.

Que haja vontade política e instalação de equipamentos públicos que permitam às mulheres a escolha pela vida. Porque hoje continuam condenadas à morte pela indiferenças de tantos Pilatos que continuam lavando as mãos enquanto o sangue feminino escorre pelo chão.


Anete Lacerda Jornalista

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