O menino da pipoca - Jornal Fato
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O menino da pipoca

"Comprar pipocas não era tão importante, ela precisava de atenção e cuidados e deixei escapar"


Ilustrativa

Levei meu carro para colocar insulfilm numa oficina afastada do centro. E decidi esperar, no local, a realização do trabalho. Enquanto aguardava, entrou um menino de aspecto franzino, magrinho, pálido, trajando uniforme escolar, com uma mochila nas costas e oferecendo pipocas. Vários pacotes de pipoca que segurava com as duas mãos, e oferecia como pipocas gourmet. Não sei se não entendi do que se tratava, se não me interessei por imaginar pedaços de bacon por cima das pipocas, ou simplesmente porque não tenho hábito de comer na rua. Respondi com uma negativa e ele seguiu em frente.

No momento que a criança desapareceu fui tomada pelo arrependimento. Uma vontade enorme de ajudar aquela criança, de aspecto franzino e ainda tendo que trabalhar. Não prestei atenção no uniforme, então perguntei as pessoas da oficina se o conheciam. Responderam-me que de vez em quando ele aparecia vendendo pipocas. Manifestei a minha vontade de ajuda-lo e pedi que pegassem um contato quando voltasse. Alguns dias depois me ligaram com a informação que a criança fora abandonado pela mãe e estava sendo cuidada por um tio.

Passaram-me o telefone do tio. Liguei inúmeras vezes e não atenderam. Entrei novamente em contato com a oficina e eles confirmaram o número. Liguei novamente, religuei até que recebi uma mensagem perguntando o que gostaria de tratar. Expliquei o meu interesse em ajudar o sobrinho de alguma forma e ele não me retornou. Queria contribuir com material escolar e leva-lo a um pediatra - a cor e a magreza dele não era normal. Pensei nos meus netos, na qualidade de vida que todas crianças merecem usufruir, e senti muito por não ter sido mais atenciosa e prestativa com aquela criança, no momento que eu a tive diante de mim.

Comprar pipocas não era tão importante, ela precisava de atenção e cuidados e deixei escapar. Por conta desse fato tomei outra decisão, esta referente aos pedintes nos sinais de trânsito. Não atendia imaginando contribuir com situação de vício, contudo me sentia mal após ignorar a mão estendida. Agora carrego dinheiro trocado no carro e não quero saber em que será usado, minha consciência não me acusa de insensibilidade, e mesmo sabendo que eles precisam muito mais que o dinheiro, o agradecimento e o sorriso me bastam. Não sei se estou agindo corretamente, mas não quero jamais ter a sensação que poderia ter feito alguma coisa e fui omissa, como aconteceu com o menino da pipoca. 


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