No Mourads... um episódio de 2007 - Jornal Fato
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No Mourads... um episódio de 2007


Era uma interessante manhã de um dia qualquer de um mês qualquer do ano de 2007, quando quase nada acontecia, mas estava para acontecer - alguma coisa me indicava assim.

Uma manhã cachoeirense, diga-se, mais propriamente manhã no Café Mourads; eu sozinho lá no fundo do café, sozinho com meus papeis, livros, revistas, jornais, sei lá quantos e quais, exatamente no local em que eu sempre me sentei e sento.

Foi nessa hora, sozinho, perdido em inauditos pensamentos, que me aparece a moça me trazendo um já adiantado projeto cultural para nossa cidade, envolvendo a prefeitura.

Elame falou que havia gostado muito de meu tempo de Secretário de Cultura de Cachoeiro, no início deste século, mais propriamente 2001 até 2002, ano que não cheguei ao final.

A proposta da moça, ainda lembro bem, era o lançamento de livro muito importante, que foi lançado algum tempo depois, já em outras circunstâncias, para além daquela bela proposta que ela passou a me apresentar.

E começou a descrever o que era o projeto - ótimo projeto. E continuou a falar sobre quem seria homenageado biograficamente - uma dos mais importantes figuras da cultura cachoeirense. E começou a explanar para mim longa e detalhada planilha de custos, tudo muito bonitinho e tudo muito certinho. Dados e mais dados, valores e mais valores meticulosamente apurados. Achei tudo maravilhoso, mas sou meio chato e não demonstrei o quanto eu gostara do projeto que me era apresentado pela moça.

Na parte cultural, ótimo. Na parte financeira, tudo legal, tudo muito bem delineado, tudo muito bem demonstrado; qualquer um entenderia. Até eu estava entendendo.

Mas eu quieto, sem dar palpite. Quando ela apresentou o orçamento na parte de viagem de ônibus ida e volta a Vitória, estava tudo certinho; o preço era o exato e eu sabia o preço da passagem, vez que, naquela ocasião, eram frequentes minhas idas a Vitória, para comprar livros, é claro.

Se meu silêncio era constrangedor para a moça, piorou muito quando ela falou no preço exato da passagem para Vitória. Ela viu o meu espanto. Não restou a ela senão me perguntar, muito assustada, mas completamente equivocada:

- "Você não gostou do projeto?" ela me perguntou.

Não perdi tempo - "Claro que gostei muito, mas isso não vai sair do papel. Você não deixou espaço para ninguém roubar quando da execução do projeto".

Eu já tinha meus sessenta anos, conhecedor da política há boas décadas. Leitor já de Maquiavel, tinha ciência muito boa do que é administração pública no Brasil - muitas vezes (ainda que não todas): era roubalheira geral, exatamente como estamos vendo agora no Brasil varonil, com gente, à esquerda e à direita, finalmente indo para a cadeia, como também vão para a cadeia os do centro e os mais espertos, que não estão em lugar algum, porque ai é mais fácil participar do butim.

 

Das Janelas de Cachoeiro, em 2018

O jornal da Capital do Estado, "A Gazeta", publicou em meados desta semana matéria muito interessante, em duas páginas, fazendo referência ao recente aniversário de Vila Velha - 23 de maio - a primeira cidade do Estado - 1535. A pauta era a paisagem da cidade no olhar a partir das casas de seus moradores.

Uma "sacada" muito legal que poderia se aproveitada pela cidade de Cachoeiro e eu diria até anualmente. Seria projeto de pouco custo e que me despertou após a minha memória exposta nesta página. Governos que gastam pouco com alto retorno cultural são exemplos que se deve seguir, para contrariar bastante o fundo no qual se ancorou a crônica aí de cima.

Imagine que a Prefeitura faça projeto semelhante, com crianças e jovens até 18 anos que melhor fotografassem a cidade, seja de suas janelas ou do percurso até suas escolas.

Poderia a Prefeitura dar aos 20 melhores selecionados, R$ 500,00 a cada um, mais vinte segundos selecionados - R$ 300,00 cada. Mais 20 terceiros selecionados - R$ 200,00 cada.

No total, vinte mil reais por ano, para fazer a alegria de 60 crianças e jovens e despertar eles e tantos outros, para as belezas naturais de Cachoeiro, ao gosto de cada um deles.

Espero repetir a crônica de 2007 no próximo ano de 2029, só que com final melhor - com cidadãos completos formados a partir de hoje, de ideias simples e baratas, mas muito importantes, acho eu.

(Nessa mesma vertente, mas falando de crônicas e da Bienal Rubem Braga, vou me manifestar proximamente - aguardem).

 

Maquiavel Ensina...em 1513

1 - O pior exemplo que pode haver é o de criar uma lei e não a cumprir, sobretudo quando sua não observância se deve àqueles que a promulgaram.

2 - Quem quer ser obedecido deve saber comandar. E só sabe comandar quem encontra uma certa relação entre suas próprias qualidades e as dos que devem cumprir suas ordens.

3 - Um governante nunca poderá estar seguro se tiver contra si a inimizade dos homens do povo, que são muitos, mas pode estar seguro se tiver contra si, os poderosos, por serem poucos.

4 - É preferível vencer com os seus a vencer com os outros. É falsa a vitória que se obtém com as armas alheias.

5 - Não se devem cumprir as promessas extraídas pela força.

6 - Quem está à frente de uma administração e não se dá conta dos males, quando eles surgem, não é realmente sábio - que só é dado a poucos.

7 - Quando não se tem certeza do que fazer, é impossível explicar o que se pensa; mas, quando se adota uma opinião firme e um plano de ação, é fácil encontrar palavras para justificá-lo.

8 - Um homem prudente deve tomar sempre a via trilhada por homens ilustres, que foram exemplos excelentíssimos a serem imitados.

9 - É preciso que o governante aprenda, caso queira manter-se no poder, a não ser bom e a valer-se disso, segundo a necessidade.

10 - Todo governante deseja ser tido por piedoso, não por cruel; contudo, ele deve estar atento para não usar mal a piedade.

11 - Acaba uma pessoa saindo-se mal quer por ser demasiadamente complacente e bondosa, quer por ser demasiadamente maldosa.

12 - Os homens elogiam o passado e se queixam do presente, quase sempre sem razão.

13 - A primeira conclusão que se pode fazer acerca da mente de um governante é observar os homens que o circundam.

14 - Não se pode dar aos guardiões da liberdade de um Estado direito mais útil e necessário do que o de poder acusar, diante do povo ou de um magistrado ou tribunal, os cidadãos que tenham atentado contra essa liberdade.

15 - Quando não te podem fazer bem, prometem a você; quando podem fazer, fazem-no com dificuldade ou nunca fazem.

16 - (Os homens) são muito humildes na má sorte e insolentes na boa.

Nota 1 - Trechos extraídos do livro "Maquiavel Essencial - 200 pensamentos escolhidos", 235 páginas, Ed. Planeta, que custa R$ 21,00 e vale muito mais.

Nota 2 - Fiz esta seleção de frases de Maquiavel com fim inicial de lê-la na Câmara Municipal de Cachoeiro, o que farei na próxima terça-feira, 29 de maio. Tão logo acabei de digitar as 16 frases, acabei entendendo, como não poderia deixar de ser, que trata-se de leitura essencial a todos os políticos, a todos os homens e mulheres do povo e ao Prefeito Victor Coelho - Acertei?


Dayane Hemerly Repórter Jornal Fato

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