Muitas histórias - Jornal Fato
Artigos

Muitas histórias

Pretenciosamente queria escrever histórias que tocassem o coração das pessoas


Foto: Ilustrativa

Pretenciosamente queria escrever histórias que tocassem o coração das pessoas. Que as fizesse verter lágrimas de emoção e saudades e renovasse a esperança dos desiludidos amorosos e sociais. Não sei se algum dia alcançarei esse objetivo.

Mas como não levo minhas escritas tão a sério assim e não me julgo escritora, sei que a resposta provavelmente será negativa, já que entre os que conseguiram marcar a vida dos leitores por seus textos  estão os ícones da literatura brasileira,  que em verso e prosa encantaram gerações e deixaram um legado de memórias e saudades permeadas por pura poesia e emoção.

Por aqui temos o nosso Sabiá da Crônica, e é quase uma afronta ousar escrever qualquer coisa em seu solo sagrado. Cachoeiro e a crônica são o seu lugar de fala, não o meu.  Rubem Braga se provou perfeito desde a primeira vez que foi substituir Newton Braga no jornal mineiro Diário da Tarde. Meio que para fazer hora com o foca, mandaram que cobrisse uma exposição de cães, esperando que se atrapalhasse diante de uma pauta aparentemente desimportante.  O resultado, um texto cheio de detalhes, simplicidade e magia, mostrou que aos 19 anos surgia um grande cronista,  que certamente estava à altura para substituir o irmão já consagrado.

Carlos Heitor Cony dizia que quando Rubem Braga não tinha assunto, ao abrir a janela o assunto aparecia. Se não aparecesse, ele comunicava que não havia assunto. E que isso era tão natural que produzia textos maravilhosos e inesquecíveis. "Fazia isso com tanto engenho e arte que dava no mesmo. A crônica estava feita".

Na crônica  "Meu Ideal Seria Escrever", Rubem Braga externou o desejo de "escrever uma história tão engraçada que  aquela moça que está doente naquela casa cinzenta quando lesse minha história no jornal risse, risse tanto que chegasse a chorar e dissesse  -- "ai meu Deus, que história mais engraçada!".

O cronista  segue desejando que a alegria da leitura contagiasse a todos, da cozinheira ao marido mal humorado, do presidiário aos doentes nos hospitais, das moradoras de ruas aos delegados que as prendem, todos contagiados pela história.

Deixa claro que  não havia, então, a vaidade de abraçar a autoria.  " E quando todos me perguntassem - "mas de onde é que você tirou essa história?" - eu responderia que ela não é minha,  que eu a ouvi por acaso na rua, de um desconhecido que a contava a outro desconhecido, e que por sinal começara a contar assim: "Ontem ouvi um sujeito contar uma história".

Que ao escrever estejamos envolvidos com histórias reais ou imaginárias, mas sensíveis o suficiente para fazer brotar um sorriso ou uma lágrima de emoção, sem o egoísmo de colocar amarras num texto que após publicado, é, ou deveria ser, de todos.  Porque a vida realmente só vale a pena na medida em que tocamos o coração das pessoas. Meu ideal seria escrever...


Anete Lacerda Jornalista

Comentários