Movimento dos caminhoneiros: permanências e rupturas - Jornal Fato
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Movimento dos caminhoneiros: permanências e rupturas

Como em 2013, vimos uma rápida ebulição de insatisfações variadas que culminaram em uma efervescência que desabasteceu o Brasil de ponta a ponta


O país parou, nesse final de maio, em razão da manifestação de caminhoneiros que protestavam contra o aumento expressivo e frequente do combustível. Em um primeiro momento, a nação também entrou no clima da paralisação e decidiu apoiar o movimento. Como em 2013, vimos uma rápida ebulição de insatisfações variadas que culminaram em uma efervescência que desabasteceu o Brasil de ponta a ponta.

Apesar disso, sabe-se muito e sabe-se nada sobre o movimento. Ele teria começado com a Confederação Nacional dos Transportadores Autônomos e teria uma pauta definida, que englobava o subsídio do óleo diesel, mas a adesão de outros grupos e outros caminhoneiros teria descentralizado e transformado o movimento num protesto de muitas lideranças e pautas variadas. Considerando o que foi verificado pela Folha do Piauí, podemos compreender porque as negociações com o Governo não evoluíram para o final das paralisações - porque, na verdade, a indefinição de uma pauta única e a pulverização de lideranças dificultava em muito uma tomada de decisões eficazes.

Por todo o movimento, pedidos de intervenção militar eram expostos em faixas e cartazes. À medida em que o apoio popular crescia, os protestos pareciam se fortalecer e ampliar as suas pautas. Queriam a queda de Michel Temer, porque a questão do combustível não era mais suficiente para colocar fim às discussões.

A intitulada "Greve dos Caminhoneiros" conseguiu o que parecia impossível - uniu uma opinião popular exaustivamente polarizada entre "direita" e "esquerda". As pessoas, independentemente de posicionamento político, estavam demonstrando apoio à paralisação. Aqueles que elegeram Dilma Rousseff sentem-se traídos desde o impeachment e não reconhecem Michel Temer como presidente legítimo; aqueles que não elegeram Dilma Rousseff e/ou apoiaram o impeachment acreditavam que Michel Temer conduziria o país a uma espécie de salvação que, dois anos depois, não chegou e não está perto de acontecer. O apoio ao movimento não veio porque as pessoas estão insatisfeitas com o preço do combustível, mas porque elas estão simplesmente insatisfeitas - com o governo, com a situação do país, com tudo.

Após muitos dias de paralisação, de negociações frustradas e da tentativa de apropriação política do movimento (com sucesso, por alguns grupos), a verdade é que precisamos compreender o que está em jogo. As fake news proliferam-se por todos os lados, com imagens forjadas simulando a adesão de militares do alto escalão das Forças Armadas aos pedidos de intervenção militar e com áudios compartilhados de forma indiscriminada, em que pessoas apresentam informações totalmente equivocadas sobre a história recente do Brasil e sobre o que é uma intervenção militar. Políticos e candidatos à Presidência da República mudam de lado ao sabor dos ventos e contradizem seus próprios discursos, na tentativa de atribuir o caos aos seus adversários.

Não há intervenção militar no nível que está sendo pleiteado. Não há, na verdade, intervenção militar prevista na Constituição Federal. Há, sim, intervenção federal, e ela acontece da União para os estados e os municípios, em casos específicos e justificadamente. A intervenção que está sendo pedida nas faixas e gritos é, na verdade, um golpe militar - que não parece ser do interesse de ninguém. O grau de insatisfação da população com seu presidente ilegítimo não pode fantasiar a realidade a ponto de distorcê-la o suficiente para se fazer acreditar que um golpe militar tem fins democráticos, contudo é o que está sendo feito diante de nossos olhos.

Os caminhoneiros têm o direito à resistência, à desobediência e à manifestação pacífica. Também têm o direito à greve, apesar de não ser esse o caso. Podemos apoiar seu direito de protestar, assim como devemos apoiar o direito de qualquer categoria profissional, ou de qualquer grupo de pessoas, criar uma pauta de negociações. Mas, não devemos apoiar pedidos de uma intervenção militar cujos efeitos serão o fim do Estado Democrático de Direito e que não atende aos objetivos de nenhum de nós. Um movimento que pede golpe militar não é um movimento democrático.

 

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