"Projeto para melhorar a lei para os bancos" - Jornal Fato
Artigos

"Projeto para melhorar a lei para os bancos"

Nele o objetivo é igualar a relação de consumo a tornando equilibrada, mas sempre protegendo o vulnerável e o HIPERVULNERÁVEL


Foto: Vanessa Vasconcelos/G1

Projeto de lei 059/2018

O Direito do Consumidor possui natureza apaixonante. Nele o objetivo é igualar a relação de consumo a tornando equilibrada, mas sempre protegendo o vulnerável e o HIPERVULNERÁVEL.

A palavra ''protegendo" possui razão de ser, visto vivermos em uma sociedade em que o maior objetivo é o lucro.

A vulnerabilidade é a pedra de toque de todas as normas que regem a relação de consumo.

Por definição, todos os consumidores são vulneráveis, nada obstante o reconhecimento da vulnerabilidade de todos os consumidores, há grupos que demonstram uma fragilidade ainda maior em relação aos fornecedores de produtos e serviços, isto é, pessoas ainda mais vulneráveis à atuação desse sujeito da relação de consumo. São os consumidores HIPERVULNERÁVEIS, isto é, aqueles que, em razão de sua especial condição, como idosos, inclusive os maiores de 80 anos, portadores de necessidades especiais, ficam ainda mais expostos às práticas comerciais, enfim, a toda atividade desempenhada pelos fornecedores no mercado de consumo.

O que se espera dos aplicadores da Lei e dos fornecedores que se atentem para as peculiaridades também dos hipervulneráveis, como manifestação concreta de responsabilidade social.

A preocupação com esse grupo de consumidores vem mobilizando a sociedade civil e a criação de legislações, tais como o Estatuto do Idoso (Leis nº 10.741/2003 e 13.466/2017), Legislação de Acessibilidade e Portadores de necessidades e de cuidados especiais (Leis nº 13.146/2015, 10.048/2000, 10.098/2000 e Decreto nº 5.296/2004). Inclusive a Lei Federal nº 13.646/2018 institui um marco de valorização e divulgação dos Direitos dos Idosos. São apenas alguns exemplos para embasar a proteção aos hipervulneráveis. Sem pretender esgotar o tema, os exemplos citados acima são apenas alguns, e servem para afirmar a vastidão que envolve a questão, já que uma das principais características dos sistemas protetivos é a sua construção fundada em cláusulas abertas. Significa que o aplicador do direito, no momento em que se depara com determinada situação, é autorizado a verificar se, naquele caso concreto, a pessoa pode ser enquadrada nas hipóteses previstas pela norma. A razão para tanto reside na dinâmica das relações sociais, que a cada dia é apta a produzir novas situações para as quais o sistema baseado na casuística não possui capacidade tutelar.

Pois bem, passada a fase de explicação acima, o que tem a ver com o título do texto? Simples, a Câmara Legislativa de Cachoeiro, rasgou e jogou fora tais direitos com este projeto que altera a legislação dos Bancos, privilegiando claramente as Instituições financeiras e as Cooperativas em detrimento aos hipervulneráveis.

AGORA PERGUNTO? PORQUE ISTO? PRECISA?

Segundo o The Economist os Bancos Brasileiros possuem lucros altos, EM QUALQUER SITUAÇÃO (https://economia.uol.com.br/noticias/redacao/2018/08/03/lucro-bancos-brasil-situacao-economica-economist.htm)

E quais foram os presentes para os Bancos com esta mudança legislativa?

Diminuição dos valores das multas - assim, pouco importa a infração, os valores das multas ficaram menores em se comparando com a Lei anterior nº 6.601/2012, ou seja, cometer infração agora ficou ''mais barato". Diminuir o valor da multa, privilegiando a quem? Atendendo a pedido de quem?

Prazo de adequação as mudanças da Lei de 180 (dias) e quando entrar em vigor sujeita-se ainda a uma advertência de 30 (trinta) dias para adequação. Esperar 180 dias para entrar em vigor? Serão 6 meses de impunidade?? e ainda apenas advertir depois para adequação em 30 dias? Para que? A Lei anterior já estava em vigor desde 2012 e já contemplava os mesmos temas. A alteração de prioridade aos maiores de 80 anos, trazida pelo ESTATUTO DO IDOSO traz a vigência desta norma como sendo imediata. Vai contrariar a norma federal? Privilegiar quem?

Alterou o atendimento ao público preferencial, ou seja, os HIPERVULNERÁVEIS acima somente serão atendidos em outros caixas, caso o atendimento preferencial esteja demorando.

Verdadeiras aberrações jurídicas.

As Instituições Financeiras e Cooperativas, há tempos já sabem de suas obrigações perante a sociedade e as legislações que versam quanto aos temas, basta ver as atuações do Procon, nos últimos anos. Dar a eles mais prazos, serve apenas para presenteá-los "natalinamente".

Por fim, de forma espantadora, desconsideraram a norma federal quanto ao atendimento prioritário / preferencial. A Lei Federal nº 13.146/2015 diz claramente em seu Artigo 9º que o atendimento prioritário deve existir em todas as instituições e serviços de atendimento ao público. O Decreto Federal nº 5.296/2004 as Leis Federais nº 10.048/2000, 13.466/2017 e 10.098/2000 também regulam o tema e elencam quem são os HIPERVULNERÁVEIS que devam ser protegidos.

A Câmara não observou a Legislação Federal inserida ao Decreto nº 5.296/2004 em seu artigo 6º, parágrafo 2º, em que descreve que o atendimento preferencial / prioritário deve ser prestado antes de qualquer pessoa, depois de concluído o atendimento que estiver em andamento, ou seja, o atendimento aos hipervulneráveis deve ser feito em total prioridade  e, em qualquer local, diferente do que foi colocado na nova norma em que o atendimento preferencial será feito nos outros caixas, somente quando for demorado. Verdadeiro desrespeito as normas Federais que protegem os hipervulneráveis.

A norma que versa quanto ao atendimento preferencial / imediato já existe, tal direito não pode ser alterado ou suprimido por norma municipal, como foi nele descrito.

Esta alteração legislativa beneficiará a quem?

Caberá ao Órgão Público protetor dos direitos do consumidor utilizar a norma federal para exigir o seu cumprimento tendo em vista ser esta norma de caráter mais protetor do que a norma municipal ao qual aparenta ser restringente de proteção, ou seja, ao hipervulnerável sua norma de proteção será a norma federal.

Estranho o fato de que em vez de fazer esta mudança legislativa, deveria os membros vereadores cobrarem das próprias Instituições Financeiras e Cooperativas o cumprimento das normas, bem como cobrar um melhor trato com os consumidores, um aumento de funcionários, por exemplo. Vejo apenas diminuindo custos, diminuindo funcionários, contudo, como dito acima o lucro será sempre grande. Atente-se a isso, vereadores!. Atentem-se na cobrança para pagamento de multas impostas pelo Procon junto as Instituições Financeiras e Cooperativas que há anos se arrastam no judiciário. Estas multas são o claro descumprimento das Leis, um claro descumprimento dos direitos dos consumidores.

 

ALTERAR A LEI DOS BANCOS, APENAS BENEFICIA OS BANCOS.

São exatamente os consumidores vulneráveis ou hipervulneráveis os que mais demandam atenção do sistema de proteção. Afastá-los ou diminuí-los da cobertura da lei, é considerada discriminação, desrespeito a valores sociais e a dignidade humana.

Promover a proteção e defesa de todos contra agressões alheias, notadamente contra aqueles que atuam com objetivo de lucro, é um dever do Estado.

E agora cabe ao Sr. Prefeito sancionar/vetar ou não esta nova Lei. PARA O BEM DOS CONSUMIDORES, SUGIRO QUE NÃO.

 

Por Rogério da Silva Athayde, Professor Universitário, Ex Coordenador Executivo do Procon Cachoeiro

[email protected]

 

Comentários